A pandemia propiciou, entre tantas novidades, um novo tipo de corrupção, impensável até então, pelo menos para mim que tinha como a pior corrupção possível aquela do sujeito que desvia dinheiro da merenda escolar, deixando as criancinhas de barriga vazia.
Pois o Demônio – porque isso só pode ser obra do Cão – tomou providências, planejou tudo direitinho e ofereceu de bandeja aos súditos, sempre a postos, uma nova modalidade de roubar, perversa torpe cruel funesta sinistra maligna canalha abominável repugnante pestilenta e quantos adjetivos mais houver serão poucos e insuficientes para classificar esta nova forma de corrupção.
De início parecia um caso isolado, ocorrido no Rio de Janeiro, e como o que vem daquelas bandas não causa mais estranheza, pouco se falou do assunto. Mas em seguida a praga se disseminou, um rastilho de maldade a incendiar o país. Eis que surge o novo ladrão: ele se aproveita da pandemia e rouba respiradores, equipamentos de proteção individual, medicamentos, tudo que estiver ligado à saúde que pode ser roubado, ele rouba.
São incontáveis as licitações fraudulentas para a compra de equipamentos de alto custo. Alguns vendem respiradores mas eles não são entregues; outros entregam aparelhos que não funcionam; há quem não entregue nada porque o dinheiro foi desviado. E os ladrões se locupletam às custas do sofrimento e da morte. Morrem crianças pequenas a velhos que se contaminam, morrem médicos, enfermeiros, todos os agentes de saúde, morre o povo brasileiro, por falta de atendimento adequado.
A Justiça é lenta; prende e solta; procrastina; faltam provas, dizem os espertos advogados de defesa; passa o tempo e esquecemos dos ladrões. Os que morreram estão mortos e não podem reclamar.
Mas Deus não era brasileiro?
Parece que se trata de golpe genuinamente nacional. Pouco ou nunca se fala de episódios semelhantes em outros países. Há de haver, sei disso, mas não nas proporções tupiniquins. Adeptos do Diabo, alguns brasileiros elevaram a arte de roubar – porque penso que é assim que eles concebem suas atitudes mais ilícitas, como o Estado da Arte de Roubar – ao mais elevado patamar de sofisticação, e não se perturbam com as funestas consequências.
Não, Deus nunca foi brasileiro. Bem que Nietzsche avisou...