“Sozinho ou acompanhado, o vinho dialoga e vive com
alma. Amo isso, cada garrafa é uma surpresa. É um ser vivo e tem personalidade.
Uma taça é um ponto para ver o mundo.”
Assim
termina a excepcional crônica de Leandro Karnal deste domingo (24 set 2017)
para O Estado de S. Paulo, com o título Beber
e viver. Ele trata de um tema relativamente banal, porém do gosto deste
blogueiro, e o autor revela-se mais humano do que nunca, a ponto de enaltecer o
ato de beber vinhos.
Porém,
no fundo está falando de Educação!
Inicia
a crônica com a estranheza que sentimos quando nos deparamos com alguém que não
bebe. Olhamos para a pessoa e ainda pedimos uma confirmação, Mas você não bebe?
Parece-nos à primeira vista um ser de outro planeta. Outro aspecto nos atinge
com mais força: o ar de censura moral que paira no ambiente – eu bebo, ele não
bebe. Em função desta censura nunca tenho coragem de perguntar Por que você não
bebe? Não me atrevo, parece uma invasão de privacidade. Pior, pode ser uma questão
religiosa. A curiosidade permanece, no entanto.
Karnal
não fica por aí. Descreve como se educou para chegar a beber – e reconhecê-los
– bons vinhos. Depois de enumerar visitas a diferentes vinícolas, acrescenta:
“Comprei mais livros. Comecei a participar de uma experiência interessante: dar
palestras sobre a História da Borgonha, por exemplo, acompanhado de um sommelier que explicava e servia um
vinho borguinhão. As aulas melhoravam a cada rolha extraída.”
De
onde se depreende que, como tudo na vida, beber vinho é um aprendizado para a
vida inteira, em cada garrafa uma surpresa. Karnal confessa, curiosamente, que
por “ligação profissional com algumas pessoas muito poderosas” chegou a provar
vinhos excepcionais, o que considero um privilégio dos deuses. Infelizmente não
é meu caso, não possuo amigos poderosos e suspeito que jamais provarei um
Petrus de boa safra e devidamente envelhecido. (Cheguei a propor uma vaquinha
entre quatro pessoas, compraríamos uma garrafa dez anos envelhecida, cada um
entraria com cinco mil pratas, uma taça para dada um, porém a pobreza ou a
usura de meus amigos impediram a realização do sonhado projeto.)
Educar-se,
em tais circunstâncias, não compreende apenas aquisição de conhecimento
teórico, é preciso experimentar, vivenciar, utilizar-se plenamente dos órgãos
dos sentidos. De modo semelhante aos livros, gosto de pegar na garrafa,
sondar-lhe o fundo com os dedos, ler detalhadamente os rótulos e conferir-lhes
a beleza ou mau gosto, conferir o teor alcoólico, a safra, depois a cor no
copo, o perfume, um sentir que não acaba mais.
Mas
é preciso uma boa companhia, com quem trocar tal experiência, ou perde-se a
maior parte do prazer.