Interessantíssima a
crônica de Sérgio Rodrigues, autor festejado de "Viva a língua
brasileira!" (Cia. das Letras), com o título Uma coleção de gulodices para quem tem fome de palavras, para a
Folha de S.Paulo (29/06/2017).
Afirma Rodrigues: “A palavra "logoteca" não está nos dicionários.
É um neologismo que significa coleção de palavras e que proponho aqui como
tradução do inglês "philavery", também um vocábulo inventado. Acredito
que "logoteca" seja uma daquelas traduções que melhoram o original.
"Philavery", definido como "coleção idiossincrática de palavras
raras e divertidas", foi um termo cunhado sem rigor etimológico pela sogra
do inglês Christopher Foyle.”
Rodrigues fala em “cultivar
palavras raras como plantas de estufa”. E enumera algumas delas, com a
respectiva “tradução” (sinônimos), que omito aqui, para instigar o leitor a
aumentar sua própria logoteca: prolegômeno, coruscante, conspícuo, aura
hierática, lábil, funâmbulo, pulcritude, logodedália, campanudo, inconsútil, abispado, atrabiliário,
prosápia, morigeração.
Rodrigues, ao falar de palavras raras, bem que podia ter
citado Evandro Affonso Ferreira, autor de “araã!”, “Os piores dias de minha
vida foram todos”, “O mendigo que sabia de cor os adágios de Erasmo de
Rotterdam”, dentre outros, escritor premiadíssimo, dono de uma logoteca imensa.
Vai aqui minha dica para quem está interessado no assunto. (Além de mim e meu
irmão, haverá mais alguém?)
Confesso que sinto inveja de quem é capaz de criar uma
palavra. Em seu ostentoso De amor e
trevas, Amós Oz faz referência a um certo Tio Yossef, homem de grande saber
linguístico, que inventou palavras para representar coisas simples de uso
cotidiano como revista, lápis, geleira, camisa, estufa, rosquinhas, carga,
monótono, rinoceronte etc, com o intuito de ampliar o vocabulário da língua
hebraica.
Sobre isso, Oz escreve (com emoção) texto que aqui
reproduzo:
“Quem consegue criar uma nova palavra e injetá-la na
corrente sanguínea de uma língua me parece que por muito pouco não conseguiria
criar as trevas e a luz: se você escrever um livro, talvez com alguma sorte, as
pessoas o lerão e apreciarão por um tempo, até livros novos e melhores
aparecerem e tomarem o lugar do seu nas prateleiras. Mas aquele que criar uma
nova palavra, este tocará a própria eternidade.”
Amós Oz também tem fome de palavras! Talvez tenha o desejo de imortalidade, manifesto através da criação de palavras.