Angustiado, poucas horas antes da decisão, ele atinou:
– Por quê tanto sofrimento?
Então foi ao cinema.
Angustiado, poucas horas antes da decisão, ele atinou:
– Por quê tanto sofrimento?
Então foi ao cinema.
Ao final da vida são tantas as coisas para as quais não tenho competência que só me resta lamentar. E de que serve lamentar?
Uma delas é não tocar um instrumento. Ouço música erudita desde a infância, por influência materna. Meu pai estudou piano; a mãe tocava harmônica – sanfona mesmo. Os filhos não receberam qualquer estímulo para aprender a tocar um instrumento. Talvez não tivessem vocação musical, porque por determinação própria nenhum deles tomou esta iniciativa. Aos 40 anos tentei aprender flauta transversal, achei difícil, desisti. Resta a frustração.
Ao menos eu poderia escrever sobre música, que continuo ouvindo diariamente. Nem para isso tenho competência. Porém, vez por outra bate a vontade de escrever sobre a Bachiana Brasileira n. 1 para oito violoncelos, de Heitor Villa-Lobos, com o único intuito de convencer o eventual leitor a ouvir esta obra prima.
A peça é composta de três movimentos. O primeiro, a Introdução (Animato), tem início com os violoncelos apresentando tema complexo, como se estivéssemos ouvindo uma orquestra inteira; seguem melodias fáceis, muito lindas, conjunto que o compositor denominou Embolada. Penso (sinto) que se trata apenas de preparação para o segundo movimento, os cellos terminando em graves profundos.
Segue-se o Prelúdio (Andante), com o nome de Modinha. A música então se eleva aos céus, é triste, quase ingênua, melancólica mesmo, sublime porque faz aflorar sentimentos de paz, de amor por toda a humanidade. Este segundo movimento contém a essência do que são as Bachianas Brasileiras, com o estilo muito expressivo chamado de “escada”, agudos e graves se alternando continuamente, quando Villa mais se aproxima de Bach. Música grandiosa. (Fica claríssima aqui minha insuficiência literária para descrever tanto a música quanto a emoção por ela despertada.)
O terceiro movimento (Fuga: Un poco animato) recebe o nome de Conversa. São os cellos alegres, efusivos, vibrantes, alternando agudos e graves, a tal conversa de instrumentos, penso que com a sensação do dever cumprido, após terem tocado o Prelúdio. O final é majestoso!
A gravação de que disponho é a do The Pleeth Cello Octet, da Hyperíon, de 1987. Me parece magnífica.
Se porventura esta pobre crônica chegar a algum eventual leitor, espero que ele não deixe de ouvir a Bachiana Brasileira n.1 para oito violoncelos de Villa-Lobos. Que ouça pela vida toda.