Enquanto grande parte dos seres humanos
busca respostas para o sentido da vida em concepções mágicas, originadas na
infância da humanidade, muitos avanços da Ciência são pouco valorizados ou
permanecem mesmo ignorados. Refiro-me às contínuas descobertas da antropologia,
da genética, da evolução biológica e de ramos afins do conhecimento.
Para um entusiasta como eu da Evolução
das Espécies, que há muito deixou de ser teoria para compor um conjunto de
fatos cientificamente comprovados, a notícia não poderia ser mais encantadora. A
reportagem é de Javier Salas e foi publicada em El País (2/5/2017).
Alguns cientistas estudam um grupo de
chimpanzés em Uganda, com cerca de 70 exemplares, há mais de 20 anos.
Os cientistas observaram que estes primatas descobriram uma nova forma de beber
água.
Em 2011, Nick, o macho-alfa da
comunidade Sonso, começou a retirar água de um poço de uma forma
nunca antes registrada: em vez de usar uma folha de árvore, ele submergia um
punhado de musgo na água para então sugá-la, como se fosse uma esponja. Em uma
semana, oito chimpanzés já tinham adotado esse novo
sistema.
Um chimpanzé
usa musgo para beber água extraída de um poço.
Foto CATHERINE HOBAITER
Salas compara esse instante com o momento
preciso em que parte da humanidade
decidiu usar garfo para comer, enquanto um outro grupo optava por usar os
pauzinhos, em vez de comer com as mãos.
“Tivemos uma sorte incrível de estar no
lugar certo na hora certa para documentar o surgimento e a difusão de novos
comportamentos no uso de ferramentas, algo extremamente raro na natureza”,
explica a primatóloga Catherine Hobaiter. A equipe, da Universidade St.
Andrews, conseguiu, com efeito, registrar o surgimento de
uma nova ferramenta e como um grupo de companheiros adotou essa
técnica ao observar o chimpanzé inovador. Isso levou a uma convivência entre dois
subgrupos culturais: os indivíduos que se baseavam na técnica tradicional de
beber e os que usavam o musgo para absorver a água.”
Três anos depois, outros cientistas
voltaram ao poço de argila. É possível que aquilo fosse apenas uma
“brincadeira”, esquecida em seguida pelos chimpanzés. Colocaram câmaras diante
do poço e observaram uma “manifestação cultural em desenvolvimento e expansão”.
No grupo inicial, 8 de 32 chimpanzés
bebiam com musgos; neste novo grupo, 22 dos 40 que foram até lá beber
utilizavam a nova maneira de beber. Em três anos, “os modernos passaram de 25%
para mais de metade do grupo”, conforme escrevem num estudo publicado pela Science Advances.
E ainda
muito interessante: “O macho-alfa
inovou, seu círculo adotou isso como tendência, e as mães consolidaram a
novidade como tradição, ao transmiti-la a outra geração. Ou seja, numa
primeira fase de expansão o fato cultural se difundiu por afinidade social,
entre o grupo mais próximo de Nick. Mas, a partir daí, numa segunda fase, foram
as fêmeas que consolidaram esta ferramenta, habituando sua prole a usá-la.”
Afirma a reportagem: “é extraordinário
ter a ocasião de ver o fenômeno surgir para estudar como se desenvolve e se
difunde, como está acontecendo na comunidade Sonso da floresta ugandense do
Budongo.”
O Louco lê a notícia com incontida
emoção. Penso que tais fenômenos são bem mais extraordinários que quaisquer
explicações mágicas sobre quem somos e o que fazemos neste planeta Terra.