A ótima escritora Maria Valéria Rezende escreve hoje no caderno Ilustríssimada Folha (5 mai 2019), sobre sua trajetória de leitora e escritora. (O título do artigo é bastante provocativo: “Jack London me transformou em cão por três dias, diz escritora.”)
Logo no primeiro parágrafo ela traz uma ideia fundamental, que reproduzo aqui:
“Tenho certeza de que todo mundo poderia ser escritor. Toda criança desenha, toda criança inventa história — nem que seja para enrolar a mãe — toda criança faz teatro com seus bonecos. Todos, então, criam literatura e são artistas. Só que depois o sistema educacional, as convenções sociais, de certa forma, fazem estancar esse processo nas pessoas.”
Esta é uma triste verdade, a de que nosso sistema educacional aniquila a criatividade inata em crianças, especialmente o ato de contar histórias. E se deixam de contar histórias, elas não desenvolvem a habilidade de escrever.
(Uma de minhas filhas, aos 6 anos de idade, dizia coisas incríveis, inventava palavras, mistura de inglês e português; logo que foi alfabetizada, escrevia historinhas magníficas, revelando imaginação incomum – eu dizia que ela seria escritora; adulta, nunca mais escreveu uma linha, embora formada em jornalismo.)
Nem todo aquele que escreve torna-se um escritor profissional, capaz de praticar alta literatura. Porém, se ele escreve para si próprio, se isso lhe ajuda a ordenar as ideias, se lhe causa prazer e aplaca o espírito, e eventualmente reparte aquilo que pensa com algumas poucas pessoas, então o exercício de escrever torna-se construtivo, não se escreve em vão. É o que chamo de escrita terapêutica.
Ler e escrever são atividades xifópagas. Assim como o hábito da leitura facilita que enfrentemos textos progressivamente mais complexos, o treinamento contínuo da escrita permite que o texto produzido seja cada vez mais claro e agradável, para quem lê e para quem escreve. Se aquele que escreve recebe crítica construtiva (há quem diga que toda crítica é construtiva), tanto melhor para seu aprimoramento literário. Se não, o remédio é perseverar, até onde é possível chegar.
Aprender é sempre bom; educar-se é trabalho para a vida inteira.