Inspirado em Donald Trump, Hélio
Schwartsman escreveu hoje (17/01/2018)
em sua coluna para a Folha sobre o poder do
palavrão, mais precisamente palavras-tabu. “Por que elas despertam reações tão
veementes naqueles que as ouvem”, pergunta o articulista. Se Trump tivesse dito
"países subdesenvolvidos, não teria despertado qualquer alarde; como disse
"países de merda" (shithole
countries), foi o barulho que se viu.
Schwartsman interroga: “Por que
diacho desenvolvemos uma linguagem e logo a seguir escolhemos alguns termos
para "proibir"?” “Xingamentos, palavrões e profanidades integram
circuitos cerebrais diferentes dos da linguagem ordinária. Há casos de pessoas
que sofrem lesões cerebrais que lhes tiram a capacidade de falar (afasia), mas
conseguem praguejar.”
O colunista cita alguns termos que
utilizamos com frequência, como "merda", "mijo",
"porra" ou "pústula", todos considerados sujos, daí sua
força ofensiva (esta é minha interpretação, diferente da de Steven Pinker, que afirma
que tais “fluidos são muitas vezes vetores de doenças, das quais tentamos nos
proteger não só física como também linguisticamente”). (Se Pinker e eu tivéssemos
razão, “porra” não seria tão empregada como verdadeira pontuação.)
Interessante a conclusão de Schwartsman:
“Seja como for, essa é mais uma modalidade do pensamento mágico que tanto
assombra nossa espécie.”
O que ele não disse, talvez para não dar a
impressão de que apoia as ideias de Trump, é que o palavrão tem seu lugar,
quando empregado na hora certa, para a plateia adequada.
Mas isso, para quem sabe e pode
usá-lo! Sim, é verdade, é preciso ter liberdade psíquica para fazer bom uso do
palavrão; seu emprego “forçado” ou repetitivo torna-se grosseria. Minha
experiência com o emprego de um sonoro e inesperado “filho-da-puta” em plena sala
de aula (para estudantes universitários) sempre produziu bons efeitos, no
mínimo para despertar os sonolentos, além de motivar os despertos.
E não me considero mal acompanhado:
Saramago muitas vezes se utilizou de palavrões, quer em artigos de cunho
político ou até mesmo na ficção, para surpreender o leitor e marcar com força a
posição dele.
Há quem nunca diga um palavrão (e é
preciso respeitar isso). Já me disseram que Machado de Assis nunca escreveu um
palavrão, e as razões seriam de ordem estética: se há palavra mais bonita, para
que empregar uma feia. Porém, esta “feiura” não seria puro preconceito, ou
moralismo disfarçado? Não é uma palavra como outra qualquer, e apenas uma
palavra?
Sei não. Às vezes, Que merda! nos ajuda simplesmente a por
para fora algo que não podemos suportar. Daí a intrigante ideia apresentada por
Schwartsman de que se trata de um tipo de pensamento mágico.