Folhetim
Quinto encontro
“Sempre pensei que pudesse aprender a escrever apenas lendo os clássicos. A ideia de aprender com os iguais foi a grande revelação desta oficina.”
Quem inicia a apresentação do quinto encontro da Oficina do Tobias é Leontina, que prefere ser chamada de Tina, 76 anos de idade, natural e residente em Guaratinguetá, SP, mulher de fibra, mãe de cinco meninos levados na infância, agora adultos, um deles professor de renome na USP, engenheiro elétrico, eu acho, ela desde sempre mulher independente, de ideias próprias, amiga dos velhos tempos de Tobias, que colocou-a no grupo sem que precisasse de disputar a inscrição de madrugada, portanto sem passar pelo processo de seleção. Tina continua:
“Tenho 76 anos e estou cansada de leituras, a cabeça cheia, acho que chegou o tempo de escrever. Não se trata de livro de memórias, nada disso, é apenas a vontade de relembrar o tempo vivido, mas com os pés no presente. Contar casos. Rir dos erros do passado, porque como diz o poeta, “fiz o que pude”. Agora resta apenas rir do passado.
Voltemos à escrita; quando ouvimos o discurso de um sabichão, desses escritores famosos que vivem dando aulas em oficinas, em grupos de leitura, até na televisão, pouco aprendemos com eles, aturdidos que ficamos com a desenvoltura deles, com o tamanho do ego deles, e nada ou quase nada apreendemos; não temos tempo nem de pensar.
Aqui não. Podemos prestar atenção nos erros e acertos dos colegas, todos (ou quase todos) entusiasmados, podemos criticar à vontade e receber críticas à vontade, temos tempo para pensar. Assim aprendemos. A partir de então, podemos voltar aos clássicos.
Escrevo esse pequeno texto com total liberdade de expressão. O professor – sei que ele não gosta de ser chamado de professor, mas Tobias é um professor – permanece calado a maior parte do tempo, ele não nos interrompe, nunca pretende estabelecer o que é certo e o que é errado, nunca impõe a última palavra, assim aprendemos cada qual a sua maneira.
Escrever para mim tornou-se um terapia..."
Tina continuou lendo seu texto por mais algum tempo e quando terminou os aplausos nunca foram tão sinceros e emocionados. Puxa vida, que mulher cheia de vida aos 76 anos de idade! André, 30, também residente em Guará, advogado, acrescentou, Pena que Tina não contou a vocês que é conhecida em toda a cidade, desde mocinha, por andar sempre de bicicleta, onde quer que vá! Aquilo despertava a maledicência das mulheres da cidade interiorana, preconceituosa, hipócrita, invejosa da independência intelectual de Tina. Lembro-me claramente desses acontecimentos porque minha mãe tinha alguma participação neles; ela definia as atitudes de Tina como “mania de originalidade”. Pura inveja.
Tobias levantou-se e dirigindo-se à classe perguntou, Quem é a professora aqui? ...ao que todos responderam em uníssono, É a Tina é a Tina é a Tina, ao som de mais palmas! Beatriz, a mais nova da turma, apenas 18 anos, cursando o primeiro semestre de Jornalismo em Jundiaí, SP, fez interessante observação, Vejam meus colegas, não há problema em se revelar, não há como não se revelar ao escrever, isso significa repartir experiências, de modo claro, se possível, e organizado, pois escrever implica em organizar o pensamento.
Esse era o gancho que Tobias precisava para convidar Moema, que permanecia calada ao fundo da sala, a ler o texto dela. Moema, por favor. Nada escrevi, e sei que este é meu último dia na oficina, murmura Moema, completamente arrasada.
Mais uma vez o silêncio, agora acompanhado de certo constrangimento, toma conta do grupo. Tobias acrescenta, Lamento, fica talvez para uma próxima oportunidade. E informa, Senhores, os dois próximos encontros serão de avaliação sobre o que produzimos até agora. Tragam suas críticas e observações por escrito, por favor. E tenham uma boa tarde.
Ao contrário do encontro anterior, saem todos cabisbaixos.