Olga Tokarczuk e Peter Handke
Vencedores do Nobel de Literatura de 2018 e 2019.
Foto: Beata Zawrel e Georg Hochmuth / AFP
Chico Buarque de Hollanda
Vencedor do Prêmio Camões 2019
Vamos tentar explicar com as palavras mais simples, como se estivéssemos conversando com crianças pequenas.
O fato de Peter Handke ter assistido o funeral do líder nacionalista sérvio Slobodan Milosevic, morto em 2006, não o impediu de ganhar o Nobel de Literatura de 2019, e ganhou porque se trata de um escritor importante. Olga Tokarczuk é conhecida também por ser politicamente engajada à esquerda, e levou o Nobel de Literatura referente a 2018 (ano em que não houve ganhadores em função de escândalo de corrupção).
Vamos repetir o surrado dito popular – porque às vezes é preciso repetir ad nausean: uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. Tem gente que não aprende. Vamos a elas.
Francisco Buarque de Hollanda ganha o Prêmio Camões de 2019, o mais prestigioso prêmio destinado aos escritores de língua portuguesa, o que deveria encher de orgulho e alegria toda a nação brasileira de leitores. Mas a coisa não é tão simples; o Sr. Presidente da República se recusa a assinar o diploma do laureado; estão em lados diferentes na política e portanto são inimigos.
O Presidente não sabe que não é o Sr. Bolsonaro quem precisa assinar o diploma, e sim o Presidente da República, de acordo com protocolo firmado pelos países de língua portuguesa. Ele ainda não consegue reconhecer a diferença entre a pessoa e a função. Para ele, pessoa e função são a mesma coisa, empossado que está no cargo de presidente – encontra-se, na verdade, empoçado, atolado, gessado, imobilizado, e portanto, impossibilitado de pensar.
É isso mesmo, simples assim: a impossibilidade de pensar. O “aparelho de pensar” (vide W. R. Bion) é pouco desenvolvido, os estímulos capazes de ajudar na formação do caráter sempre foram pobres, a mente permanece infantilizada.
Chico Buarque sabe pensar, tanto que se tornou um grande escritor. Ele declarou que se sente duplamente premiado, que a não assinatura do Sr. Bolsonaro significa outro Prêmio Camões. Com tais considerações, ele rebaixa o debate ao nível primário do Sr. Bolsonaro; também ele confunde pessoa e função; momentaneamente Chico também não pode pensar, tomado por ideologia emburrecedora.
Este é o princípio do funcionamento do fundamentalismo de toda e qualquer espécie, seja religioso, político, ou qualquer outro: a incapacidade para pensar. De resto, é bem mais fácil, a comidinha já vem pronta.
O exercício que podemos fazer (apenas um exercício, estímulo para pensar) é discutir o valor dos premiados, e, em especial, dos não premiados. Aproveito para expressar aqui minha profunda frustração, quase que indignação, pela ausência do nome de Amós Oz entre os ganhadores do Nobel. É bem provável que seu posicionamento político a favor dos palestinos tenha influenciado os julgadores. (Lá como aqui, eles também não sabem que uma coisa é uma coisa...) O mesmo podemos dizer a respeito do grande escritor americano Philip Roth, outro não-ganhador do Nobel. Imperdoáveis injustiças.
A Literatura há de sobreviver a estes jogos infantis.