Bernardo Carvalho escreveu hoje (23 abr 2021) para a Folha: “Literatura não é manual nem modelo de comportamento”.
Nabokov observou sobre suas aulas na Universidade Cornell: “Tentei tornar os alunos bons leitores, que leem livros não pelo motivo infantil de se identificar com os personagens, nem pelo propósito adolescente de aprender a viver ou pelo projeto acadêmico de fazer generalizações”. (O grifo é meu.)
Afirma Carvalho: “Nabokov combatia, já naquela época, uma leitura convencional e conservadora, que hoje se impõe como novidade e às vezes até como revolução. ...a literatura inversamente não pode ser atrelada à simples evocação de uma questão moral. Literatura não é manual nem modelo de comportamento. Ela não tem de seguir diretrizes, requisitos e restrições impostas à liberdade de explorar tudo o que é humano. Literatura não é um problema de caráter.”
Bernardo Carvalho conclui: “Fazer a literatura corresponder à representação de um modelo moral serve de ilusão paliativa, é o correlato natural e desesperado da nossa impotência diante da indecência da realidade, diante do mal. Mas também é desistir da charada que não conseguimos resolver. É jogar a toalha antes mesmo do início da partida.”
Acrescento eu, despretensiosamente: Literatura é Liberdade.
(Não posso esconder: tenho batido numa mesma tecla neste blog, a de que em Literatura é preciso cuidar da forma, às vezes mais que do conteúdo. Isso seria uma limitação à liberdade; de fato, não o é. Quarto de despejo, de Carolina Maria de Jesus, publicado em 1960, é um bom exemplo de que a liberdade de expressão acaba por vencer: Carolina deixou a forma de lado e fez prevalecer as circunstâncias. Estrondoso sucesso, revivido recentemente com nova edição do livro.)
Reitero: Literatura é liberdade de pensar, tanto por parte de quem escreve, e mais ainda por parte de quem lê. Mas que o leitor não se iluda: “Literatura não é manual nem modelo de comportamento”, como afirma Carvalho.