Como não se
deliciar com o texto de Machado de Assis, logo no primeiro capítulo de Dom
Casmurro! Eis um pouco do que chama a atenção de um simples leitor como eu e
que me provoca espanto riso admiração, grande prazer enfim, com a leitura.
1 - ...”um
rapaz aqui do bairro”: desperta no leitor o sentido de realidade, de
proximidade, de algo concreto, verdadeiro, acontecendo aqui perto, do “nosso”
bairro.
2 - ...”que
eu conheço de vista e de chapéu”: meu irmão Paulo, exímio tradutor (fez
inúmeras traduções de Machado para o Esperanto), conhecedor de Machado como
poucos, certa vez me perguntou, Como traduzir esta expressão “conhecer de
chapéu”? Difícil, Paulo! Como traduzir tamanha delicadeza?
3 - ...”falou
da Lua e dos ministros”: falou de nada e de tudo, como os ingleses falam do
tempo, ao iniciar qualquer conversa.
4 - ...”mas
não passou do gesto; estava amuado”: o leitor pode ver perfeitamente o
rosto emburrado do rapaz. (Gosto mais de emburrado, que tem a mesma origem de
amuado: mulo ou burro.)
5 - ...”alcunhando-me
Dom Casmurro”: o verbo alcunhar, eu nunca tinha visto ou ouvido! Que modo
fantástico de justificar para o leitor o título do romance que ora se inicia!
6 - ...”deram curso à alcunha”: que
elegância!
7 - ...”que
afinal pegou”: esse ‘pegar’ é moderníssimo, contemporâneo mesmo. O apelido
pegou, dizemos ainda hoje!
8 - ... seguem-se vários exemplos engraçados
de como a alcunha pegou entre os amigos do autor. Terminam, os exemplos, com
“só não lhe dou moça”: uma graça!
9 - ...”fumos
de fidalgo”: mais uma vez a elegância incomparável!
10 - ...”poderá
cuidar que a obra é sua”: surge aqui a ironia machadiana, fina, delicada,
mas que cutuca, percebe o atento leitor.
Cada leitor
haverá de destacar o que mais lhe afetou no texto. Cada leitor, um texto!
(O primeiro
capítulo está no post anterior deste blog.)