sexta-feira, 4 de julho de 2014

Morre um poeta




             Há quem afirme que quando morre um poeta uma estrela se apaga no céu. Penso que as estrelas se apagam independentemente do que ocorre nesse pequeno planeta que habitamos, mas é sempre triste a morte de um poeta, pois o mundo torna-se mais concreto.
            Ontem morreu Ivan Junqueira, poeta, ensaísta, crítico literário, tradutor de primeiríssima qualidade.
            Vou a minha estante de poesia e retiro um pequeno livro com o delicioso título de A sagração dos ossos (Civilização Brasileira, 1994). O prefácio é de Antônio Carlos Secchin e tem uma bela abertura: “Entre mortos e feridos, salva-se ninguém. Com efeito, é de perdas e dissipações que se ocupa este livro de Ivan Junqueira, e não será exagero afirmar que, na muito intensa e pouco extensa poesia do autor, A sagração dos ossos representa a culminância de temas e formas obsessivamente trabalhados ao longo de mais de trinta anos de exercício criador”.
            Pois é deste livro que retiro certo poema, que transcrevo como singela homenagem ao poeta Ivan Junqueira.

E se eu disser

E se eu disser que te amo – assim, de cara,
sem mais delonga ou tímidos rodeios,
sem nem saber se a confissão te enfara
ou se te apraz o emprego de tais meios?
E se eu disser que sonho com teus seios,
teu ventre, tuas coxas, tua clara
maneira de sorrir, os lábios cheios
da luz que escorre de uma estrela rara?
E se eu disser que à noite não consigo
sequer adormecer porque te agarro
à imagem que de ti em vão persigo?
Pois eis que o digo, amor. E logo esbarro
em tua ausência – essa lâmina exata
que me penetra e fere e sangra e mata.

            Morre o poeta, fica a poesia.

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