Camões, diante de uma reprodução de Monet.
Uma amiga,
mãe de três filhos, sabedora de meu amor pelos cães, puxou conversa, como que a
pedir conselho ou aprovação, Meus filhos estão implorando para que eu compre um
cachorrinho, mas estou relutante, uma trabalheira danada, moramos em
apartamento, vai ser xixi pra todo lado, a briga pra decidir quem vai descer
com o cachorro, despesas com veterinário, ração, vacinas, sem falar na
implicância do marido, antevejo o inferno...
Faça a
vontade deles, respondi, o cão humaniza a família.
Não estou
certo de que ela levou a sério esta minha assertiva, pois não teceu qualquer
comentário. Pode ter pensado, Humanos somos nós, não os cães; por consequência,
apenas o humano é capaz de humanizar.
Devo admitir
que há lógica nesta afirmação, mas como humanização diz muito mais respeito às
emoções que à lógica, reafirmo a ideia de que temos muito a aprender com os
animais, especialmente com os cães.
Algum tempo
depois, a amiga veio com a novidade, André, você não sabe o que minha filha de
cinco anos me disse outro dia, Mamãe, depois que o Lulu chegou nós não brigamos
mais! A menina referia-se às constantes brigas entre os irmãos, que tornaram-se
mais raras com a presença do bichinho.
Segundo
Ulisses Tavares, organizador do singelo mas bem cuidado livrinho Poemas que
latem ao coração (Editora Nova Alexandria, 2009), às vésperas de sua morte
ocorrida no dia 9 de outubro de 1998, o grande poeta e tradutor José Paulo Paes
registrou numa última gravação:
Dúvidas
Não há nada mais triste
do que um cão em guarda
ao cadáver de seu dono.
Eu não tenho cão.
Será que ainda estou vivo?
O poeta foi bem mais radical que eu, ao sugerir que a
ausência do cão junto ao homem indica que ele já morreu, embora muitas vezes
não se aperceba disso. O cão traz vida à casa!
Foto: Mercêdes, Brasília, junho de 2013.
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