Certa vez ouvi de uma
paciente, Parece que o senhor gosta mais de cachorro que de gente. Naquele
momento, achei melhor não responder, precisava pensar sobre o que acabara de
ouvir.
O que a levou a fazer o diagnóstico tão radical? Estaria
se sentindo preterida, abandonada? O “problema” era dela ou era meu?
Aprendo muito com meus cães. E os amo de verdade. Por que
tanto amor? (Tem sido um sofrimento interminável a recente perda de meu
cãozinho Camões.)
Hélio Schwartsman responde em sua crônica Lancheiras caninas, agora publicada em
livro indispensável: Pensando bem... – um olhar original a
respeito de liberdade, religião, história, política, violência, comportamento,
educação, ciência, da Editora Contexto (2016). São textos selecionados,
já publicados na Folha de S. Paulo ao longo de muitos anos, e que considero
leitura indispensável para aqueles que desejam aprender a pensar.
Voltemos ao tema inicial desta crônica. Afirma
Schwartsman:
“Em tempos modernos, coube
a primatologistas como Frans de Waal questionar o dogma [as coisas se explicam
em termos de genes ou não se explicam]. Não é uma coincidência. Eles trabalham
com nossos parentes mais próximos que, não por acaso, são os que exibem
atitudes mais parecidas com as nossas. E, se descendemos todos de um ancestral
comum relativamente recente e possuímos mais ou menos a mesma química cerebral,
por que não podemos ter os mesmos sentimentos?
É
claro que precisamos de cuidado para não atribuir a um cachorro emoções extremamente
intelectualizadas como amor romântico ou êxtase religioso, mas, como observa De
Waal, se não enxergarmos as semelhanças entre os animais e nós, corremos o
risco de deixar escapar algo fundamental, sobre eles e sobre nós.”
Agora,
se gosto mais de gente ou de cachorro...
Para uma pergunta assim tão perigosa, caberia resposta fugidia: "Gosto mais de gente que gosta de cachorro."
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