No caderno Ilustrada da
Folha, no último domingo (20/10), Ferreira Gullar publicou a crônica A magia da
imagem (1), título que sugere algo aparentemente batido, repetitivo, exaurido
mesmo, embora verdadeiro: a força da imagem. Ele começa falando da necessidade
do homem pré-histórico em pintar bisões cravejados de flechas nas paredes das
cavernas, talvez para que as caçadas tivessem êxito. Ou seja, imagem e
realidade unindo-se em uma única representação, dando origem à Arte.
Às tantas, o poeta afirma: “Esse universo de
significações, no entanto, não se contenta com a expressão visual das formas,
das imagens. Ele necessita decifrá-las, traduzi-las na linguagem das palavras.
Mas como disse Ernst Cassirer, as linguagens são intraduzíveis entre si, ou
seja, o que a imagem diz, a palavra não consegue dizer.”
Eis a contradição interessantíssima: a necessidade humana
de interpretar imagens e, ao mesmo tempo, a impossibilidade de fazê-lo.
O que me remete imediatamente a Arthur Bispo do Rosário e
sua obra indecifrável. Falo especialmente das peças em que repetição de objetos
comuns, prosaicos, banais, causam no expectador o indizível impacto, a
impossibilidade do entendimento, a falta de sentido.
Num primeiro momento, o expectador associa esta falta de
sentido à reconhecida loucura do autor. Num segundo momento, e esta é a ideia que
prevalece hoje em dia, percebe-se que há algo mais além da loucura, ou que a
loucura por si só não explica a obra de arte.
O expectador
“sofre” em silêncio o impacto da imagem, sem ter o que dizer, sem saber o que
pensar, diante do objeto que se lhe é apresentado. Chega a doer na alma.
Gullar
acrescenta mais adiante: “Isso não significa, porém, que a expressão vocabular
seja um exercício descabido e inútil. Pelo contrário, por ser também uma
linguagem autônoma, a palavra cria significações – leituras – que se somam à
expressão visual das imagens. Nesse sentido, o texto crítico, analítico ou
poético sobre uma obra de arte pode de certo modo incorporar-se a ela, não como
tradução da obra, mas como interpretação que a enriquece.”
Quando o
homem dedica-se ao estudo da História da Arte – as imagens e as palavras lado a
lado –, é precisamente isso que ele busca, enriquecer-se a partir das
diferentes leituras das obras de arte, que são dinâmicas e mudam com o passar
do tempo e com os diferentes modos de ver e pensar a própria arte.
(1) http://www1.folha.uol.com.br/colunas/ferreiragullar/2013/10/1358629-a-magia-da-imagem.shtml
Fotos: A.Vianna, 2010, São Paulo.
Fotos: A.Vianna, 2010, São Paulo.
Interessante. Parece que entre o ver e o dizer há uma sedução e uma barreira. Como entre os seres humanos: por maior que seja o afeto, algo fica sempre de fora. Fascina e angustia.
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