Querida Suzete,
tempos estranhos esses que estamos vivendo. Tragédias e mais tragédias, mortes e mais mortes, de repente perdemos o homem que nos traduzia os acontecimentos cotidianos de forma lúcida e corajosa, e o país acorda de luto nesta terça-feira 12 de fevereiro, uma tristeza sem fim. Ficou difícil pensar.
Depois de ler quatro ou cinco jornais e percorrer o Twitter de ponta a ponta, o sentimento é de desalento, de desesperança. Então bateu a vontade de escrever para você, minha amiga.
Há um animal novo aqui em casa. Como o irmão mais velho se chama Costela, botei-lhe o nome de Bisteca. Não pegou, ninguém gostou, lindo animalzinho da raça dachshund, ou linguicinha, ou Cofap, com nome tão vulgar. Passou a chamar-se Lila, inspiração oriunda de uma certa série da tv, A amiga genial. Todo mundo gostou. Com o passar dos dias, agora com 3 Kg e uma voracidade infernal, tem sido chamada de Anjo Exterminador, Capeta, Cão Chupando Manga, Dragão de Komodo, e até Filha-da-Puta, quando prega os caninos em meu pé.
O prazer de Lila é infernizar a vida dos outros quatro cães daqui de casa, morder a orelha das duas pequenas e o rabo das grandes. Vamos ver se melhora com a idade e um pouco de juízo. Mas ela é linda!
Não sei o que seria desta casa sem a presença dos cães. Seria um ermo triste cheio de silêncio. Sabe, Suzete, os que já se foram – Dora, Berta, Lenda, Camões, Lola – permanecem todos presentes, enchendo a casa de lembranças doces, do amor que nos legaram.
Enveredei por este assunto canino para lhe contar que esteve conosco nesse fim de semana o meu amigo Sergio Pripas, de São Carlos – a Capital do Mundo!
Falávamos de cães, naturalmente, dos diferentes temperamentos de cada raça, Sergio teve um dogue alemão arlequim, lindíssimo, eu tive um rottwailer imenso chamado Zenon, falávamos das diferentes personalidades desses animais, de como se relacionam com seus donos, (e o Anjo Exterminador mordendo nossos pés debaixo da mesa da cozinha, Ôôô Raça-Ruim!), até que lhe apresentei o gold kiwi, que ele não conhecia, embora seja grande conhecedor de plantas, flores, frutos, bichos e muito mais. Ele gostou, impossível não gostar de um gold kiwi, e ficamos dissecando o complexo sabor da fruta, um tanto do kiwi comum, o verdinho, um toque de laranja, de limão, textura de mamão, sabor elegante, até que meu amigo saiu-se com a antológica frase, que por si só constitui um excelente microconto:
Gold kiwi é cachorro.
Portanto, Suzete, aqui estão os três grandes microcontos da Literatura Universal:
1 - O Dinossauro, de Augusto Monterroso: “Quando acordou, o dinossauro ainda estava lá.”
2 - Manoel de Barros: “Ovo de lobisomem não tem gema” (que só eu classifico como microconto; para o autor, um verso apenas).
3 - Agora, Sergio Pripas: “Gold kiwi é cachorro.” Para a glória eterna, como o terceiro melhor microconto de todos os tempos!
Suzete, nunca recebi um microconto seu. Quem sabe na próxima carta?
Bem, termina aqui o lero-lero sobre cães e afins. Termina também esta cartinha, que já me deixa mais animado para enfrentar o dia-a-dia deste país tropical “abençoado por Deus e bonito por natureza”...
Do amigo de sempre,
andré
Como já ensinou Hipócrates, a palavra cura.
ResponderExcluirDeliciosa carta, quantas outras não seriam necessárias para relatar essas poucas e enormes horas deste memorável fim de semana.
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