Sabia que não podia beber e afiar facas. Acabou
perdendo a mão esquerda.
quarta-feira, 30 de novembro de 2016
Acaso
Com o título Busca Infrutífera, Hélio Schwartsmam
(Folha de S. Paulo de hoje) assim resumiu o sentido – ou a falta de sentido – da
tragédia com a Chapecoense e jornalistas no voo para Medelín:
“Tragédias como essa mexem conosco não só porque temos a
capacidade de nos identificar com a dor dos envolvidos mas também porque temos
dificuldade em aceitar a tirania do acaso. A própria condição humana pode ser
descrita como uma tentativa de vencer o aleatório e assumir controle pleno
sobre o mundo. É claro que é uma busca infrutífera.
Algumas tentativas são bastante
infantis. É o caso das religiões, em que criamos entidades imaginárias às quais
atribuímos poderes mágicos e depois ficamos implorando para que essas fantasias
nos ajudem. Outras são parcialmente efetivas. É o caso das engenharias, em que
estudamos os problemas e procuramos solucioná-los racionalmente. Só que
conseguimos no máximo domesticar um tantinho o acaso, jamais derrotá-lo. Nós o
odiamos, mas é ele que rege o universo.”
Escrevo
com frequência neste blog que a humanidade está dividida em dois grupos: os que
creem e os que não creem. Este conceito me ajuda a compreender o embate
permanente entre esses dois modos de pensar.
Diante de uma tragédia
com a qual convivemos há dois dias, os que creem valem-se de um deus para
aliviar a angústia, aceitar o que não podem compreender, para consolar.
Schwartsman chama tais recursos
de infantis. Penso que não há nada de
mau nisso, se funcionar. Nossa infância nos acompanha mesmo por toda a vida.
Os
que não creem, não se utilizando dessas fantasias, como assinala Schwartsman,
precisam valer-se da razão, e aceitar a impossibilidade de controle do que
chamamos Destino. Abrir mão do controle é exercício para toda a vida. A
onipotência infantil representa exatamente a crença no controle absoluto, apenas
um mecanismo de sobrevivência do fragilíssimo ser humano no início da vida.
Crescimento psíquico implica em abrir mão desta onipotência e aceitar nossa
fragilidade.
De
um modo ou de outro, crendo ou não crendo, sofremos todos, em clara manifestação natural de solidariedade. Como o sofrimento é
inevitável e nos acompanha desde que nascemos diante das contínuas perdas que
vivenciamos, parece que aprender a sofrer é um bom caminho. Precisamos aprender
que sofrer não mata, que é apenas o outro lado da moeda, o da felicidade.
Horas
antes da tragédia em questão, minha felicidade era completa (e bastante infantil,
reconheço) com a conquista do Campeonato Brasileiro pelo Palmeiras, meu time
desde que nasci. Bastaram algumas horas para que girasse a roda da Fortuna.
Agora
não dá nem para comemorar.
terça-feira, 29 de novembro de 2016
Maestro de uma única sinfonia
Partitura original da Segunda de Mahler
Gilbert Edmund Kaplan (1941-2016), nascido em Nova
Iorque, foi um executivo,
economista, jornalista
e, o que é surpreendente nessa história, maestro amador.
Em abril de 1965 um amigo levou-o para
assistir um ensaio da Segunda Sinfonia de Mahler no Carnegie Hall,
de Nova York. A música pouco
lhe interessava na época, preocupado em tornar-se um economista de Wall Street e fundar a revista Institutional Investor,
que anos depois venderia por 75 milhões de dólares (255 milhões de reais).
“Mas depois de escutar a Ressurreição,
Kaplan não conseguiu dormir”, afirma Jesús Ruiz Mantilla, em artigo para El País (28/11). Kaplan comprou as 17 versões gravadas até então da Segunda
Sinfonia e tomou aulas de regência com Charles
Zachary Bornstein.
Em 1982 Kaplan fez a sua estreia como maestro, alugando (!) o Avery Fisher Hall em
Nova Iorque, para reger sua sinfonia predileta com a American Symphony e o Westminster
Symphonic Choir.
Em 1987 ele gravou a Sinfonia n.º
2 de Gustav Mahler
com a Orquestra
Sinfônica de Londres, e em 2002, com a Orquestra
Filarmônica de Viena.
Informa Mantilla: “Anos depois obteve o
manuscrito original da partitura – o comprou da Fundação Mengelberg, onde Alma Mahler o
havia depositado em 1920 – e o interpretou diante do público de Nova York e
Salzburg, entre outras cidades. Essa cópia está prestes a se transformar na
obra musical mais cara da História quando for a leilão na terça-feira na Sotheby’s de Londres e
provavelmente superar os 4 milhões de euros (14 milhões de reais). Terá
quebrado o recorde que desde 1987 é de Mozart
por algumas de suas sinfonias e que está em 3,6 milhões de euros (13 milhões de
reais).”
Ao longo de sua vida, Kaplan fez mais
de cem apresentações públicas regendo a Segunda de Mahler, a única peça que
conduziu. Criou a Fundação Kepler, dedicada ao ensino e divulgação da música de
Gustav Mahler.
segunda-feira, 28 de novembro de 2016
Hipnose, um mistério?
Hypnos, deus do sono, filho de Nix (a noite) e Érebro (as trevas).
Com o sugestivo título O mistério da Hipnose, Márcio Diniz
publica pequeno artigo para o site Universidade do Cotidiano, em parceria com
Catraca Livre (28/11/2016). Parece que o artigo
original é de Jéssica Tomio Ehmke.
Interessantíssimo o relato. Em
1997, o psiquiatra americano Henry Szechtman fez experiência com oito pessoas,
que foram vendadas e ouviram a gravação: "O homem não fala muito. Mas, quando
ele fala, vale a pena ouvir o que diz".
O pesquisador desligou o som e pediu
aos voluntários que imaginassem a frase novamente. Em seguida hipnotizou a
todos e informou que iria repetir a gravação, mas mentiu, não havia som algum. Porém,
o grupo informou ter ouvido a mesma gravação.
Eles sofreram uma alucinação auditiva. Ao
monitorar seus cérebros, Szechtman confirmou que durante a alucinação e a
gravação, a atividade cerebral era a mesma. Quando as pessoas apenas imaginavam
a frase, a atividade cerebral era diferente.
Conclui o estudo: “a hipnose existe e é
uma simulação perfeita da realidade, muito mais forte que a imaginação. Uma
pessoa hipnotizada pode realmente ver, ouvir e sentir o que é sugerido.”
Aproveito este relato para registrar
minha experiência pessoal sobre o assunto. Frequentava eu o último ano do curso
de Medicina quando, por razões insuspeitas, interessei-me pela hipnose. Li
alguns livros, estudei a técnica, busquei uma cobaia para minha primeira
tentativa de tornar-me um hipnotizador.
Escolhi minha irmã, com 15 anos, e que,
surpreendentemente, aceitou o desafio.
Hipnotizei-a
com facilidade! Nem eu mesmo acreditava no que estava vendo. E para confirmar o
fato, dei-lhe uma ordem pós-hipnótica, que às 3 horas da tarde em ponto ela
ligasse a televisão.
Ora, não era hábito da menina ver tevê àquela hora. Por isso, temi que ela não cumprisse a estapafúrdica ordem, mesmo
que lhe viesse à consciência o desejo de fazê-lo.
Esperei ansiosamente pelo horário
marcado. Pois às 3 em ponto, tendo meu irmão como testemunha, ela virou-se para
mim e disse:
– Estou com muita vontade de ligar a
televisão, mas nessa hora não tem nada pra ver, não é mesmo?
– Nada, respondi. E ela se afastou sem
dizer palavra.
Na mesma época, no hospital em que estudava,
hipnotizei um colega um ano mais novo e dei-lhe a seguinte ordem pós-hipnótica:
– Quando eu colocar minha mão em seu
ombro e disser DORME, você cairá em sono profundo.
Eu dava a ordem sempre perto de um sofá
ou poltrona, pois ele dormia imediatamente, para espanto dos colegas.
Por razões igualmente insuspeitas
encerrei subitamente minha carreira de hipnotizador. Penso que fiquei com muito
medo de lidar com algo que eu nem mesmo compreendia.
Já no período de formação em
psicanálise, 40 anos mais tarde, uma colega me perguntou surpresa:
– Mas existe mesmo esse negócio de
hipnotismo?
Ao que respondi com segurança:
– Claro que existe! É um estado
alterado da consciência. (Agora, o que isso quer dizer, até hoje não
descobri...)
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