sábado, 30 de abril de 2016

Perfume barato


Primeiro chegou o perfume, barato, nauseante, preguento, a inundar
o ambiente. Espanto geral: depois chegou o mulherão.

quinta-feira, 28 de abril de 2016

quarta-feira, 27 de abril de 2016

Visita do papa Francisco à África

A foto do dia



Aguardando a chegada do Papa, em roupinhas de domingo!

Foto: Ben Curtis / AP

Cinema, a melhor diversão

Casados há 65 anos, os filhos crescidos, formados, 8 netos, 3 bisnetos, Augusto e Conceição levavam vidinha regrada, alimentação saudável, um copo de vinho no almoço, outro no jantar, às noites de sábado um cálice de vinho do Porto, ele com 90, ela com 89 anos, ambos com relativa saúde, tanto quanto é possível nessa idade.
As brigas e discussões da juventude já não existiam. Os dois padecendo de uma certa surdez, escutavam apenas o que lhes interessava, deixando de lado as discordâncias. Porém, uma forte concordância havia se tornado o elemento mais importante da vida do casal, que os unia fortemente, motivo de intermináveis e deliciosas conversas: ambos gostavam muito de cinema.
Dito assim, parece banal, nada demais gostar de cinema, todo mundo gosta de cinema, quem não gosta de cinema? Há quem prefira ver filmes pela televisão, outros colecionam DVDs, piratas ou não, há os que preferem ir ao cinema de verdade, fãs da tela grande, não importa o meio, mas ver um bom filme ainda é um bom programa, para todas as idades. (Os mais abastados esticam a noite com jantarzinho em um bom restaurante, regado a vinho no mínimo honesto.)
Augusto e Conceição viam filmes em casa, pela tv. Depois do jantar frugal, lá iam os dois para a sala de televisão. Os filmes eram escolhidos com antecedência, de modo que na hora marcada, entre 9 e 10 horas da noite, preparavam-se com certa excitação para o espetáculo, o aparelho no volume mais elevado.
Iniciado o filme, entrado em seu décimo minuto, fosse de ação, violência, suspense, terror ou filme de amor, como gostavam de dizer, Conceição ouvia o ressonar de Augusto, já em sono profundo. A mulher olhava para o marido com benevolência, sorria, voltava ao filme.
No dia seguinte, o diálogo ao café da manhã era sempre o mesmo:
– Gostou do filme, Conceição?
– Gostei muito!
– Então conta...
– A Coreia fora invadida pela China, o povoado da família Kim destruído pelo bombardeio chinês, e a população inteira teve que abandonar o país em navios americanos. No embarque tumultuado a menininha Liu caiu do ombro do irmão Jong e perdeu-se na multidão. Kim, o pai, voltou para procurá-la, o navio zarpou e também ele se perdeu. Antes, porém, Kim recomendou a Jong, menino de apenas 5 anos de idade, que cuidasse da mãe e do irmão mais novo; doravante, ele seria o chefe da família! A partir de então o menino abriu mão da própria vida em função da família. Foram morar em Seul, o irmão mais novo entrou para a universidade, Jong trabalhou para sustentar a todos, foi ganhar dinheiro nas minas de carvão na Alemanha, onde quase morreu vítima de desabamento, depois lutou na guerra do Vietnã, onde perdeu uma perna...
O café terminava, o casal sentava-se na varanda aberta para o belo jardim, e Conceição continuava o relato do filme. Como ela também cochilara durante a projeção, pulava trechos inteiros da história, inventava personagens, trocava nomes, misturava os filmes já vistos, acrescentava sempre um caso de amor em seu relato, e nem sempre o final coincidia com o mostrado no filme. Nada disso importava. Augusto prestava absoluta atenção, fazia perguntas, ria, emitia sons de genuíno espanto em alguma passagem mais interessante, embirrava com algum personagem do qual desgostava, deliciava-se com o relato da mulher. Ao término da conversa, o invariável comentário:
– Bom mesmo este filme! E hoje, o que teremos?
– Um filme italiano de amor.
Se um filho chegasse para visitar os pais, a primeira pergunta que fazia era:
– E aí, pai, como foi o filme de ontem?
– Ótimo! A história de uma família que se perdeu na Coreia.



Umbrellas

Meus quadros favoritos


Pierre-Auguste Renoir


terça-feira, 26 de abril de 2016

Truman



            Talvez Truman pudesse ser visto como um filme comum, já que o tema de que trata é frequente no cinema, não fora a interpretação magistral, inesquecível, digna de todos os prêmios, do argentino Ricardo Darin, com roteiro e direção do espanhol Cesc Gay.
            Julian (Darin) é um ator de teatro que vai morrer em breve. Um câncer disseminado o leva a recusar qualquer outro tipo de tratamento, o que o condena à morte num período de tempo relativamente curto.
            Julian tem um cachorro chamado Truman e um grande amigo, Tomás (Javier Cámara), que o visita por quatro dias, vindo de um país distante. O animal e o amigo criam o fio condutor da narrativa.
            Serão quatro dias vividos com grande intensidade, com toques de humor, muita sensibilidade, sem descambar para a pieguice ou mau gosto, em torno da perda gerada pela morte.
            A relação de Julian com seu cão presta-se perfeitamente para o tratamento do tema perda. Aqueles que convivem com seus cães por muitos anos sofrem terrivelmente na hora da morte do animal. Diante desta perda, alguns adquirem outro cachorro, seguros de que um dia voltarão a sofrer com a morte dele. Outros afirmam que jamais terão outro animal de estimação, pois não suportariam vivenciar a perda novamente.
            Mas não é assim a vida, uma sucessão de perdas desde que nascemos? Aí entra outro aspecto decisivo do filme de Cesc Gay: Tomás, o amigo, aceita a opção feita por Julian, a de recusar outras formas de tratamento, e permanece a seu lado, amorosamente, sem criticá-lo, sem tentar fazê-lo mudar de atitude, uma verdadeira e rara amizade.
            Porém é a interpretação de Ricardo Darin, volto a enaltecer, que emociona o expectador. Sua expressão corporal, os silêncios, a expressão ora de raiva, ora de revolta, a resignação, o amor pelo cão, a confiança que deposita no amigo, são manifestações que emprestam tremenda credibilidade à trama, fazendo com que o expectador se identifique e se entristeça profundamente por Julian.
            Filme bom é aquele sobre o qual podemos conversar ao sair do cinema. No primeiro momento o expectador fica paralisado pelo sofrimento expresso pela trama de Truman, ele precisa de um tempo para colocar os próprios sentimentos em ordem, para só depois falar do assunto.
Não há dúvida, o filme é tristíssimo, mas vale a pena chorar por ele.