domingo, 10 de janeiro de 2016

Spotlight



              Abordar o assunto é tão espinhoso quanto relevante. Quando ganha as telas do cinema, então, a repercussão há de se multiplicar, especialmente em se tratando de um ótimo filme. Estou falando de Spotlight, o filme dirigido por Tom McCarthy, baseado em fatos reais, o abuso de crianças por padres católicos.
            A investigação jornalística sobre a pedofilia na Igreja Católica de que trata o filme ocorreu no início dos anos 2000 e rendeu aos jornalistas do Boston Globe o prestigioso Prêmio Pulitzer. À época, a repercussão dos fatos revelados foi gigantesca, atingiu a Igreja em todo o mundo católico, sem poupar o próprio Vaticano. Como não poderia deixar de ser, a Igreja sobreviveu aos escândalos. Quanto às crianças abusadas...
            Mas vamos ao filme. Ele retrata o difícil processo de investigação jornalística, a resistência por parte da Igreja e dos advogados que durante anos defendiam as vítimas e seus familiares, todos interessados em manter os fatos sob sigilo, da própria sociedade católica da cidade de Boston, temerosa em desafiar instituição tão poderosa. Os próprios jornalistas encarregados da investigação, pequeno grupo de quatro profissionais que formavam o “spotlight”, surpreenderam-se ao constatar que eles mesmos haviam recebido a denúncia há muitos anos , sem que prestassem a devida atenção à mesma.
            Penso que o grande mérito do filme reside em apresentar a história da investigação e sua bombástica conclusão de forma quase asséptica, sem arroubos sensacionalistas – nada de cenas explícitas –, sem apelos à emoção fácil, que aqui poderia ser traduzida por indignação, sentimento plenamente justificável em se tratando de crianças traumatizadas, muitas delas para o resto de suas vidas. Mesmo assim, a simples cena de um coro infantil cantando uma canção de Natal no ambiente majestoso de uma catedral á capaz de mobilizar no expectador algum sentimento da ordem do ódio.
            Ignoro se foi esta a intenção do diretor, mas penso que ele dispensou os adjetivos para enaltecer o substantivo, suficientemente forte, capaz de, por si só, prender a atenção da audiência. (Mas não abriu mão de um elenco de altíssima qualidade, que, sem dúvida, coloca o filme entre os melhores do ano.)
            O problema está longe de ser resolvido dentro da Igreja. Esperemos que filmes como Spotlight possam manter o assunto em evidência, em vez de fingirmos todos que ele não existe.
            

Um comentário:

  1. Aí está o valor do cinema: denúncia com arte, a contribuir para amenizar a selvageria no mundo.

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