Há certas
expressões que surgem na mídia, sabe-se lá de onde, e que grudam como chiclete.
Passam a ser utilizadas por todos os meios de comunicação, incorporadas até ao
vocabulário popular, sem que ninguém discuta seus significados e propriedades,
alguns deles bastante inadequados. Vou me ater a duas dessas expressões.
A primeira é a tal “precisão cirúrgica”, largamente usada
na invasão do Iraque pelos Estados Unidos. A televisão mostrava, ao vivo,
determinados alvos, geralmente construções baixas, casas, depósitos, serem
atingidos por misseis teleguiados, disparados por aviões de caça, e
pulverizados diante do olhar admirado e atônito do telespectador. E como o alvo
fosse atingido com extrema acurácia, surgiu a adjetivação “cirúrgica”.
Ora, a Cirurgia, embora exija
precisão em sua técnica, jamais foi utilizada com a finalidade de destruir. Ao
contrário, a precisão é necessária para que se evitem danos colaterais, ou
seja, que estruturas nobres ou tecidos sadios sejam lesados durante a operação
cirúrgica. Os militares podem alegar que também suas operações visam evitar
danos colaterais, porém o dano central ainda mais eficaz constitui o objetivo
do ataque.
Tendo praticado a Cirurgia por
longos anos, repudio a expressão “precisão cirúrgica”, ciente de que este
protesto cai no mais absoluto vazio. A expressão já pegou.
O segundo caso, atualíssimo e também
ligado à guerra, diz respeito à expressão “trégua
humanitária”.
Humanitária o caralho!
(O meu eventual leitor há de me perdoar este ato destemperado.
Justifica-se pela indignação de que este blogueiro está tomado no momento,
diante do massacre que vem sendo perpetrado em Gaza pelas tropas israelenses.)
Trégua sim, humanitária não. Humanitarismo
significa praticar ações por amor ao semelhante, e até mesmo aos animais de
outras espécies, sem esperar nada em troca. O que não há nas guerras é
exatamente amor ao semelhante. Há ódio, muito ódio.
Este tipo de trégua dita humanitária
tem outros interesses. Um deles é o de reagrupar forças, reavaliar estratégias,
reposicionar os instrumentos de destruição, recompor a munição, tratar dos
feridos, para atacar em seguida, com maior eficiência e ódio, e às vezes com
hora marcada para o reinício do ataque!
Caso prevalecesse o senso de
humanidade, as tréguas seriam definitivas. Ou as guerras nunca teriam iniciado.
Ainda no segundo exemplo, sei que de
nada vale minha indignação. A expressão também já pegou, é manchete de primeira
página em todos os jornais nos últimos dias. (Tréguas anunciadas, para logo em
seguida serem desrespeitadas.) Porém, como diz o subtítulo deste Louco por
cachorros – late, rosna, mas não morde –,
o autor dá-se ao direito de latir e rosnar, como fazem meus cães diante
de qualquer ameaça. Indignar-se ainda é preciso.
Muito bom. A respeito da tal "trégua humanitária" eu mesmo já tinha pensado e falado. Beira o cinismo. Já a precisão "cirúrgica" do armamento, talvez não menos cínica, tem como associação de significado a tentativa de destruir o "tumor" terrorista do inimigo sem espalhar destruição no bairro inteiro ( = tecido nobre em torno). Seja como for, de humanitária, nada tem, tampouco.
ResponderExcluirAgora pergunta se eu gosto do tal "gol espírita"...
As palavras, sempre as palavras...