Eliane Brum, gaúcha de Ijuí, é
documentarista, jornalista e escritora. Eu já conhecia a moça, de crônicas
esparsas em jornais e revistas, e já gostava muito dela.
Em uma resenha publicada no Valor em 11
de julho último, por Gonçalo Júnior, tomei conhecimento de seu novo livro, Meus
desacontecimentos: a história da minha vida com as palavras (Ed. LeYa, 2014). O
livrinho (porque de formato pequeno, 140 páginas) é ótimo!
Eliane
começa falando da irmã que morreu antes dela nascer e que marcou
definitivamente sua primeira infância. “E é curioso que minha primeira
lembrança seja a morte”, escreve ela. Lembrei-me do último romance de Valter
Hugo Mãe, A desumanização, cujo tema central é
semelhante: uma das irmãs gêmeas morre e a outra passa a ser chamada de “a
menos morta”. Havia uma mais morta e outra menos morta.
Lembrei-me ainda do livro de José Saramago intitulado As
pequenas memórias (Companhia das Letras, 2006), onde o autor revive a infância, seus medos,
humilhações, toda sorte de dificuldades.
A menina, que desejava ser Isabel mas foi nomeada Eliane,
cresce, fala da família – particularmente dos avós e pais – com aguçadíssimo
senso de observação, numa escrita bem humorada. Transcrevo a descrição do avô:
“Meu avô a rigor não era um
analfabeto, faltavam-lhe as vogais da alma.
Não se interessava por romances
nem por sutilezas. Para ele, a vida parecia bastante simples. Bastava uma bela
polenta, uma mulher bonita que soubesse fazer uma bela polenta, uma caçada de
codornas (para comer com uma bela polenta, na companhia de uma mulher bonita).”
Eliane entremeia o passado com atualidades, destacando
sua atuação como jornalista de posições firmes e independentes.
“A reportagem me deu a
chance de causar incêndios sem fogo e espernear contra as injustiças do mundo
sem ir para a cadeia. Escrevo para não morrer, mas escrevo também para não
matar.
Ouvi de alguns chefes que a
indignação faz mal para o exercício do jornalismo, que bom jornalista não tem
causa. Discordo. Indignação só não faz bem para quem tem como única causa a do
patrão.”
O
livro termina – a autora por volta de seus 21 anos de idade – com uma confissão
corajosa, intimista, de uma mulher que aprendeu fazer de sua fragilidade a sua
força. Eliane destaca, acima de tudo, a importância da escrita nesse processo, e que ela domina magistralmente.
Eu,
modestamente, não me canso de repetir: a escrita é terapêutica.
Dá vontade de ler o livro. Que ótima resenha!
ResponderExcluir