terça-feira, 30 de julho de 2013

19. O que dizer aos pais que perderam seus filhos?


Para começar a conversa, devo dizer que não sei o que dizer aos pais que perderam seus filhos. É sempre uma conversa muito difícil, quanto a isso não resta dúvida.
Nas ocasiões em que me vi em tal situação, a primeira coisa que me ocorreu dizer foi que, não tendo vivido aquela experiência, a de perder um filho, tinha muito mais a aprender do que ensinar. Isso parecia imprimir um tom de realidade, porque verdadeiro, à conversa que se iniciava, e trazer alguma segurança a ambos os interlocutores. Como se eu dissesse, Você sabe mais do que eu e está em melhores condições para se ajudar a si mesmo. Porém, deixava claro que, mesmo em desvantagem, minha disponibilidade para ajudar era total.
Num momento como esse, a pergunta “o que é ajudar?” ganha enorme dimensão! Sei que “solucionar o problema para o outro” não significa ajudar, mesmo porque constitui missão impossível. Então, cabe uma outra pergunta, aparentemente singela mas de difícil resposta, Como posso ajudar? Quem ouve esta pergunta atentamente e pode pensar sobre ela inicia um processo de autoajuda, com o auxílio do interlocutor/terapeuta. É como se perguntasse a si mesmo, O que posso fazer por mim?
Voltemos à questão inicial, o que dizer aos pais que perderam seus filhos? Embora tenha já confessado que não sei o que dizer, talvez possa ajudar o fato de que sei o que NÃO dizer.

1. Jamais digo Sei o que você está sentindo. Pela simples razão, exposta acima, de que não posso saber o que nunca experimentei. Esta mentira “sei o que você está sentindo” é ofensiva àquele que sofre. Em nada conforta. Demonstra apenas que o interlocutor/terapeuta não dispõe de empatia para aquele com quem conversa. Em outras palavras, Ele não sabe o que está dizendo. Talvez esteja apenas tentando aplacar seu próprio sofrimento, diante da enorme impotência por não saber.

2. Nunca digo Deus sabe o que faz. Ou Deus escreve certo por linhas tortas. Ou Devemos aceitar os insondáveis desígnios de Deus. Ou Tenha fé em Deus. Isso é tudo que um pai ou uma mãe não precisa ouvir nesse momento, pois, dirão, É esta a infinita bondade de Deus!?  Talvez eu possa explicar que, nessas circunstâncias, blasfêmia não é pecado. (O que é o pecado?) O ódio, bem como o amor, são sentimentos humanos, e é com eles que devemos trabalhar, depois de reconhecê-los em nós.

3. Não posso dizer Tenha paciência, isso vai passar. Mas quando?, haverão de perguntar os pais imersos em insuportável sofrimento. Eles desejam o alívio imediato, pois aquela dor é mesmo insuportável. Como então ter paciência?
Talvez possam admitir que o tempo, que passa, ajuda, mas a questão é o que fazer enquanto o tempo passa!

4. Não digo Você precisa consultar um psiquiatra, que lhe prescreverá um antidepressivo e um ansiolítico. Luto não é depressão. Por mais impiedoso que possa parecer, viver e sofrer a tristeza do luto são necessários para a superação do próprio luto. Tristeza não é depressão, portanto não precisa ser medicada.
Porém, luto pode transformar-se em depressão. Então, é possível que seja necessária a ajuda do psiquiatra.

5. Se os pais apegam-se fervorosamente a uma religião ou seita num momento como este, não me cabe condená-los, por mais que aquela seita ou religião contrariem minhas próprias convicções. A ilusão, muitas vezes, é o recurso possível, e fazemos isso desde que nascemos, diante das dificuldades que vamos encontrando.

6. Não faço promessas que não poderei cumprir, como garantir a eficácia de qualquer forma de tratamento ou terapia. Não pode haver qualquer garantia com relação ao que o outro vai pensar, sentir ou fazer.

7. Se não sei o que dizer, permaneço em silêncio. Talvez seja esta a regra fundamental, e a mais difícil de ser praticada. Ouvir não é pouco.

Há muitas outras coisas que posso ou devo dizer, e que não posso nem devo dizer aos pais que perderam seus filhos. Sempre digo que se trata de algo antinatural, pois o natural é que os pais morram antes dos filhos. 

Um comentário:

  1. Como é dificil! Lidar com a morte é dificil . Seria necessária uma educação para a morte. Desde pequenos.

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