quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Alta ajuda




Alta ajuda é o título do livro de Francisco Bosco (Foz Editora, 2012), que traz na capa negra apenas uma escada branca, mais nada, e consegue chamar a atenção de quem passa os olhos pelas estantes de uma livraria qualquer.
            À primeira vista (o potencial leitor ainda passeia pela livraria em busca de algo interessante e ainda não tomou o livro nas mãos), trata-se de um trocadilho meio sem graça, mesmo porque autoajuda (refiro-me aos livros) não tem graça nenhuma. Mas a escada, dessas que se sustentam de pé, branca, um desenho simples em fundo negro-aveludado, pegou-me pelo pé.
O autor convida o leitor a subir os degraus por conta própria? Ele sugere que ao subir a escada é possível ter uma visão mais abrangente da vida? Que desafio nos está sendo proposto? Autoajuda não é, com toda certeza. Estas foram algumas das minhas divagações diante do livro ainda fechado. Não o comprei, nem o abri, não sei por quê.
Meses depois, em outra cidade, em outra livraria, eis o livro novamente diante de mim, com o mesmo título sem graça e sua escada provocadora. Desta vez, abri-o, vi do que se tratava, comprei, e aqui o recomendo.
            Na apresentação o autor explica que a expressão “alta ajuda” foi cunhada por José Miguel Wisnik, e que Bosco apenas assinou embaixo. Como gostei muito do livro, e aprecio o Wisnik, agora passo a considerar o título como um jogo de palavras, em vez de reles trocadilho. (Assim funciona a cabeça da gente, guiada por nossas próprias conveniências.) E o autor, carioca, nascido em 1976, doutor em teoria da literatura, deseja tão somente reunir “tentativas de iluminação de questões psíquicas, comportamentais, sexuais, afetivas, em suma, éticas.”
            Bosco inicia o primeiro capítulo com título à Montaigne: Da Amizade, e diz “Meu regime ideal é ficar só – na companhia dos livros – durante todo o dia. Gosto de gente depois das oito da noite e três cervejas”. Pronto, a partir daí foi um devorar de páginas.
           Os capítulos se sucedem com temas os mais variados: A fadiga e o casamento, O que é contemporâneo?, Complexo de dálmata, Amar e amor, Sexo e liberdade, A TV no século XXI, Melancolia, Proust e a música, para citar alguns deles.
            Chamou-me particularmente a atenção A força do pensamento negativo, onde o autor relata: “Nunca li um livro de autoajuda. Certa vez tentei ler O segredo, porque queria entender como funcionam esses textos. Achei o livro absolutamente tedioso, ...e ofensivo: não só à inteligência, mas à experiência humana em geral. A autoajuda prega basicamente o famigerado pensamento positivo”.
Concordo inteiramente com o autor: em situações muito difíceis na vida, “o pensamento positivo não é apenas ineficaz, mas nocivo: ele impedirá, com seus mantras de otimismo escapista, que o sujeito possa ativar os mecanismos dialéticos da existência, capazes de fazer com que, aprofundando-se, uma coisa reverta-se em seu oposto.” (O grifo é meu.)
E Bosco conclui o tema: “Pode ser que em determinadas situações da vida o pensamento positivo seja recomendado (diante, por exemplo, de doenças graves). Mas, naquelas situações em que rodamos em círculos dentro de labirintos psíquicos, pensar que eles não existem não ajuda. O pensamento negativo é a melhor, se não a única saída: é preciso concentrar as forças para quebrar o muro.”
Isso é alta ajuda!

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