Os nossos políticos, especialmente em tempo de
eleição, fogem da pergunta O senhor acredita em Deus?, como o Diabo da cruz. Aqueles
que não creem oferecem as respostas mais enviesadas, metafóricas, elípticas,
incompreensíveis enfim, pois é proibido dizer que não acreditam em Deus.
Perderão muitos votos, na certa.
Os
jornalistas, incluindo aqui os mais variados matizes de colunistas, há muito
também não tratavam do assunto, evitando o tema não por questões eleitoreiras,
mas em função da possível perda de popularidade e suas consequências. Penso que
isso está mudando, e na edição de 4 de agosto, no caderno Cotidiano, a Folha
estampa artigo do Antonio Prata, com o título Laranjas e chocolates,
aproveitando-se do rescaldo da visita do
Papa ao Brasil. Prata escreve:
“Apesar
de lamentar terrivelmente não ter qualquer esperança no além, acredito que o
ateísmo – quando amparado por boa poesia, pelo menos – é uma concepção mais
elegante, mais profunda e que encerra mais respeito à vida do que a fé em Deus.
Que eu exista, que você exista, que haja árvores que dão frutos e frutos que
dão sementes, que esses frutos sejam doces justamente para que eu e você os
comamos e espalhemos as sementes... Não é infinitamente mais belo se nada disso
fizer parte de roteiro algum? Veja o universo, que coisa fantástica. Pra que
serve? Pra nada: eis o grande milagre.”
Foi
corajoso o articulista. Imagino a quantidade de mensagens que recebeu, em
protesto diante da sinceridade dele.
Este é um dos pontos centrais do filme
Hannah Arendt, dirigido por Margarethe von Trotta e protagonizado por Barbara
Sukowa, ainda em cartaz nos cinemas. Ao reportar-se ao julgamento de Adolf
Eichmann, em Jerusalém, para a revista New Yorker, Hannah
destaca que nem todos que praticaram os crimes de guerra podiam ser
chamados de monstros, e que alguns judeus colaboraram com os alemães para
viabilização do Holocausto.
As análises de Arendt
geraram furiosa polêmica nos meios sociais e acadêmicos, a autora acusada
(injustamente) de defender Eichmann e condenar os próprios judeus, um
verdadeiro massacre. Mas ela manteve seus pontos de vista, publicando em
1963 o livro Eichmann em Jerusalém, que consagrou a expressão "a
banalidade do mal", o subtítulo deste mesmo livro.
A visão destacada por
Arendt permanece polêmica até os dias de hoje, e assim há de permanecer ainda
por um longo tempo. O mesmo podemos dizer em relação à existência ou não de um
deus, esta divisão marcante que se estabeleceu entre os que creem e os que não
creem. Penso que quanto mais se publica sobre o assunto, em qualquer mídia,
desde que num tom amigável e bem humorado, como o fez Antonio Prata, maior
tolerância há de se desenvolver entre os homens. Pois parecem não ter fim as
guerras em nome de um deus...
Também li e, sem ser ateu, gostei muito do artigo do Prata. Sou pela tolerância. Quanto à elegância do "nada" ateu,pairam dúvidas... Talvez fosse mais coerente dizer: 'não sei!'.
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