terça-feira, 13 de agosto de 2013

Ateus declaram-se.


Os nossos políticos, especialmente em tempo de eleição, fogem da pergunta O senhor acredita em Deus?, como o Diabo da cruz. Aqueles que não creem oferecem as respostas mais enviesadas, metafóricas, elípticas, incompreensíveis enfim, pois é proibido dizer que não acreditam em Deus. Perderão muitos votos, na certa.
            Os jornalistas, incluindo aqui os mais variados matizes de colunistas, há muito também não tratavam do assunto, evitando o tema não por questões eleitoreiras, mas em função da possível perda de popularidade e suas consequências. Penso que isso está mudando, e na edição de 4 de agosto, no caderno Cotidiano, a Folha estampa artigo do Antonio Prata, com o título Laranjas e chocolates, aproveitando-se  do rescaldo da visita do Papa ao Brasil. Prata escreve:

“Apesar de lamentar terrivelmente não ter qualquer esperança no além, acredito que o ateísmo – quando amparado por boa poesia, pelo menos – é uma concepção mais elegante, mais profunda e que encerra mais respeito à vida do que a fé em Deus. Que eu exista, que você exista, que haja árvores que dão frutos e frutos que dão sementes, que esses frutos sejam doces justamente para que eu e você os comamos e espalhemos as sementes... Não é infinitamente mais belo se nada disso fizer parte de roteiro algum? Veja o universo, que coisa fantástica. Pra que serve? Pra nada: eis o grande milagre.”

            Foi corajoso o articulista. Imagino a quantidade de mensagens que recebeu, em protesto diante da sinceridade dele.

Este é um dos pontos centrais do filme Hannah Arendt, dirigido por Margarethe von Trotta e protagonizado por Barbara Sukowa, ainda em cartaz nos cinemas. Ao reportar-se ao julgamento de Adolf Eichmann, em Jerusalém, para a revista New Yorker, Hannah destaca que nem todos que praticaram os crimes de guerra podiam ser chamados de monstros, e que alguns judeus colaboraram com os alemães para viabilização do Holocausto.
As análises de Arendt geraram furiosa polêmica nos meios sociais e acadêmicos, a autora acusada (injustamente) de defender Eichmann e condenar os próprios judeus, um verdadeiro massacre. Mas ela manteve seus pontos de vista, publicando em 1963 o livro Eichmann em Jerusalém, que consagrou a expressão "a banalidade do mal", o subtítulo deste mesmo livro.
A visão destacada por Arendt permanece polêmica até os dias de hoje, e assim há de permanecer ainda por um longo tempo. O mesmo podemos dizer em relação à existência ou não de um deus, esta divisão marcante que se estabeleceu entre os que creem e os que não creem. Penso que quanto mais se publica sobre o assunto, em qualquer mídia, desde que num tom amigável e bem humorado, como o fez Antonio Prata, maior tolerância há de se desenvolver entre os homens. Pois parecem não ter fim as guerras em nome de um deus...

Um comentário:

  1. Também li e, sem ser ateu, gostei muito do artigo do Prata. Sou pela tolerância. Quanto à elegância do "nada" ateu,pairam dúvidas... Talvez fosse mais coerente dizer: 'não sei!'.

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