domingo, 30 de junho de 2019

Questão de conhecimento


Aos 4 anos, entregou ao pai uma folha de papel escrita de cima a baixo.
– Lindo, meu filho, leia para mim!
– Sei escrever, não sei ler.

Flores perto da janela

Meus quadros favoritos



Marc Chagall

imensa cordilheira




a imagem da cordilheira
imensa
majestosa 
cheia de mistério 
impregnou a retina do viajante 

ele revê fotografias
compulsivamente 
na esperança de reencontrar o sentimento 
provocado pela experiência 
de vê-la de perto 

imensa cordilheira 
cheia de mistério




Foto: AVianna, jun 2019, Mendoza
IPhone8

sábado, 29 de junho de 2019

João é um menino esperto

Aos amigos Paulo e Flávia



João é um menino esperto de 4 anos, que por influência paterna torce para o Flamengo.
            Com esta idade já escreve seu nome completo com letra caprichada e arrisca copiar uma ou outra palavra que encontra em jornais e revistas. Destaca-se no maternal pela permanente alegria e bom relacionamento com os coleguinhas. João é querido pelas professoras.
Qual não foi a surpresa do pai, quando o filho lhe entrega folha de papel escrita a lápis, de cima a baixo, com alguma coisa legível, outras nem tanto.  
            – Que lindo, João! Leia para mim o que está escrito.
            Ao que o menino responde incontinente:
            – Eu sei escrever, não ser ler. 
            Agora o susto do pai não tem mais tamanho. Como assim? Sabe escrever mas não sabe ler? E João emenda com autoridade:
            – Leia para mim, pai.
            Definitivamente embasbacado, o pai não sabe o que responder. Não deseja decepcionar o filho, orgulhoso daquela façanha. Mas não pode ler o que está “escrito”, se é que há alguma coisa escrita naquela folha de papel, pensa ele.
            Inteligente e sensível, João percebe o embaraço do pai.
            – Não tem importância, pai, minha mãe lê para mim.
            João entrega a folha para a mãe, que “lê” sem qualquer dificuldade a história escrita pelo filho, para a alegria do menino e desespero do pai, praticamente um analfabeto.
            O pior: quando perguntado sobre sua cor preferida, João responde:
            – Verde!

Jovens de hoje


A crônica de hoje de Hélio Schwartsman para a Folha de S.Paulo (29 jun 2019), com o título Papo de velho, deve interessar a velhos e jovens, ao menos àqueles que ainda estão interessados em aprender alguma coisa nessa vida.
Schwartsman afirma que “A gente sabe que ficou velho quando começa a se perguntar o que há de errado com os jovens de hoje”. É que ele não consegue entender o comportamento dos estudantes universitários, que, “cada vez mais, advogam por “safe spaces” (espaços seguros), “trigger warnings” (alertas sobre textos potencialmente chocantes) e se metem em protestos exóticos, entre outras esquisitices”.
Ronald S. Sullivan Jr, advogado e professor de direito em Harvard, aceitou advogar para Harvey Weinstein, o produtor de Hollywood acusado de crimes sexuais. Alunos pediram a cabeça do acadêmico e a administração de Harvard anunciou que não renovará o contrato de Sullivan como “dean”, embora ele conserve sua posição como professor. 
Informa Schwarttsman: “A primeira maluquice dos estudantes é confundir o advogado com seu cliente. Sullivan não é suspeito de nenhum delito. Talvez mais grave, os alunos estão sugerindo que existem crimes tão graves que as pessoas acusadas de tê-los cometido não devem nem ter direito a um advogado. Aliás, nem precisam passar por um julgamento para ser consideradas culpadas. Lamento dizer, mas isso é a negação dos pilares mais básicos do sistema de Justiça ocidental.”
O articulista diz que se sente estimulado sempre que se depara com “uma ideia que me tira de minha zona de conforto”. E mais: ”Isso é parte inafastável do processo de aprendizagem”. Com os universitários em questão isso não funciona assim. Dificuldade para pensar?
            Há muito, vejo que jovens universitários vêm se tornando mais conservadores que seus professores, assumindo muitas vezes posições francamente retrógradas e reacionárias, e esta impressão não é fruto de minha imaginação ou preconceito; advém da longa experiência como professor universitário. Ao final de minha vida acadêmica, tal constatação atingiu seu ápice, colaborando para a decisão de minha aposentadoria. Não desejava mais trabalhar naquele ambiente.
            Agora vem o brilhante colunista afirmar que está “oficialmente velho”, por não entender as atitudes dos moços. E conclui com ironia: “Mas isso tudo provavelmente não passa de papo de velho.”








quinta-feira, 27 de junho de 2019

Itamaraty e a ideologia de gênero


Segundo a Folha de S. Paulo, em reportagem de Patrícia Campos Mello (26 jun 19), diplomatas receberam nas últimas semanas instruções oficiais do comando do Itamaraty para que, em negociações em foros multilaterais, reiterem “o entendimento do governo brasileiro de que a palavra gênero significa o sexo biológico: feminino ou masculino”.
Pensava eu que gênero e orientação sexual eram construções sociais, e não apenas determinações biológicas. No entanto, para segmentos da direita, a “ideologia de gênero é um ataque ao conceito tradicional de família”. 
“De acordo com fontes do Itamaraty, a instrução foi formalizada porque o Brasil, ao utilizar essa definição, quer evitar ambiguidades. Procurado, o Itamaraty afirmou tratar-se apenas da retomada da definição tradicional de gênero.”
Para Camila Asano, coordenadora da Conectas Direitos Humanos, essa medida pode “comprometer a credibilidade internacional do país”. “Se tal ordem não for imediatamente revertida, o Brasil se unirá a diplomacias que propagam posições retrógradas em espaços internacionais, ignorando avanços nacionais e globais na luta contra desigualdades e preconceitos”, afirma.
Informa ainda Patrícia Mello: “A nova instrução do Itamaraty se alinha a inúmeras declarações do chanceler brasileiro, Ernesto Araújo, e do presidente Jair Bolsonaro. Em discurso em seminário promovido pelo Itamaraty e pela Fundação Alexandre de Gusmão (Funag) no dia 10 de junho, Araújo criticou o globalismo, afirmando que o conceito promove ideias como a "ideologia de gênero", ao lado do “racialismo” — segundo ele, a concepção da sociedade dividida em raças — e do ecologismo, definido pelo ministro das Relações Exteriores como a ecologia transformada em ideologia.
“Se o Itamaraty orienta seus diplomatas dessa forma, o Brasil pode se distanciar de países que acolhem refugiados perseguidos justamente por essas razões. Isso mancha a reputação do país como referência na agenda de proteção a refugiados”.
            
            O tema está sendo tratado aqui veladamente, responsabilizando apenas a chamada “direita”, seja lá o que isso possa significar, pela ideologia de gênero. Por trás disso tudo está o fundamentalismo religioso que assola nosso país. Ninguém se assuste se, de repente, o Itamaraty passe a defender o Criacionismo, ou até mesmo, o Terraplanismo.




inverno em Mendoza




inverno em Mendoza
hora de beber o vinho
secas as parreiras



Foto: AVianna, jun 2019, Iphone8

Tempos londrinos


Penso que esta fotografia foi tirada em Londres, mas não estou certo disso; talvez por volta de 1986 ou 1987. Maria Helena pode confirmar. À esquerda, do alto de seus quase dois metros, está Doug, também conhecido por Doguinho. À direita, nosso pai Ofir. No centro, mãe e filho.
            Chama a atenção a fisionomia de todos, aparentemente tristes. Ofir esboça um sorriso. Shaun demonstra alguma insatisfação, ao permanece de braços cruzados e a cabeça pendida. Maria Helena olha para outro mundo.
            Também não estou seguro dessa minha interpretação de sentimentos dos fotografados.


Dona Fifina


Dona Josefina Viana Ramos, nossa avó por parte de mãe, nunca nos permitiu maior intimidade, era mulher de um século distante. Casou-se com Manuel e foi morar em Floriano, RJ. Manuel, portanto, é nosso avô.
            Manuel morreu de cirrose e Fifina – assim era conhecida – casou-se com João Ramos, carioca, morador da Tijuca, à Rua Campos Salles, torcedor fanático do América. Velhinho simpático, nos levava a mim e meu irmão Paulo ao estádio do clube, a um quarteirão da casa dele.
            Ah!, com eles residia o famoso Lobo, belo pastor alemão, que tratávamos com o maior respeito, medo mesmo.
            Grande parte da Família jamais viu essas fotografias, nem chegou a conhecer as personagens. Por isso, faço esses registros.





Cordilheira majestosa

O viajante, ao se deparar com a Cordilheira dos Andes, seja lá de que ponto for, do avião, ao pé da montanha, de longe, para uma visada abrangente, ele tenta fotografá-la, registrar aquele monumento que tanto o emociona, mas não consegue captar senão uma pálida visão do espetáculo. Frustrado, guarda a máquina fotográfica, olha apenas, para guardar na memória o indescritível.





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Foto: AVianna, jun 2019
Iphone 8

terça-feira, 18 de junho de 2019

Cinismo

pobre homem
desconheces o que há diante de ti
se muro 
abismo 
fera
pântano
se é justo o momento
se é hora de silêncio ou de palavra
se de mover ou de quedar
estás imerso em breu
nada vês 
a ninguém podes pedir socorro
pobre homem
contas só com tua escassa companhia
sem a opção de isentar
vai
decide
escolhe
age
às cegas
és livre para não saber
assim o mundo 
assim a vida
resta o cínico consolo do arrependimento


                  Paulo Sérgio Viana

domingo, 16 de junho de 2019

a bondade de maria

Galeria de Família




embora maria tenha lavado minhas fraldas quando nasci, pois não as havia descartáveis na época, no mês de janeiro mais chuvoso de que se tem notícia até hoje na capital, a primeira lembrança que dela tenho data de nossa mudança para a casa vizinha à casa de meus avós no interior, e eu já era bem crescidinho, e maria era empregada de breno e cici desde sempre, salvo antes de maria chegar à casa de meus avós, e aí residia o mistério.
            maria era cozinheira e a cozinha o seu reino. lá ela mandava e desmandava, escolhia os ingredientes no mercado municipal, carnes, verduras, legumes, frutas, os mais variados temperos, incluindo a pimenta malagueta, a indispensável banha de porco que emprestava sabor característico às comidas, estipulava ela mesma o cardápio da semana, às quartas pastel de queijo, carne, palmito ou frango, a especialidade dela, embora não fossem menos apreciados o torresmo, o feijão mulatinho, o bife acebolado às segundas, o frango ao molho pardo às quintas, o arroz soltinho todo santo dia. manjar de coco com ameixas, a sobremesa preferida da avó. no verão, sorvete de abacaxi. 
            não havia quem desconhecesse a infinita bondade de maria. analfabeta, meio índia, quase sempre coberta de andrajos, porém boníssima. chaninho, o seu gato predileto, com tinturas de angorá; havia outros, inúmeros, apareciam e desapareciam com o passar dos dias, apenas chaninho permanecia, alimentado com carde de primeira, para desespero de cici. quando alguma gata da rua dava cria, maria pegava os filhotinhos, enfiava-os num saco com uma pedra, jogava da ponte na correnteza do ribeirão dos alves.
            – coitadinhos, não terão o que comer, alegava pesarosa.
            havia, porém, um mistério: não se falava uma palavra sobre o passado de maria. anos mais tarde ouvi o comentário de que ela era filha bastarda de um irmão de meu avô, que então tomou para si a guarda da menina.
     hoje sei, também sou filho de maria, que me ajudou nos meus primeiros dias de vida. sem dúvida, faz parte da família.

Bauman

Charge do dia



sábado, 15 de junho de 2019

Pimenta do reino



fotominimalismo



Começa a crescer o cacho de pimenta do reino. Lindeza!

Foto: AVianna, jun 2019, jardim.
iPhone 8S


Dora & Berta

Galeria de Família


 Dora, a mastim, e Berta, a rottweiler, moram eternamente em nossos corações. Saudade!

Palmeiras Campeão Mundial Sub-17





As categorias de base do Palmeiras seguem fortes. Neste sábado, o time alviverde derrotou o Leganés, da Espanha, por 2 a 1 e conquistou de forma invicta o Mundial Sub-17 pelo segundo ano consecutivo. Em 2018, o título veio depois de uma goleada por 4 a 2 em cima do Real Madrid na final.





quinta-feira, 13 de junho de 2019

Cãononizar-se, ou não?




bem faz o meu cachorro
que não é muçulmano nem cristão
atende pelo nome
e nem se importa em saber
porque resolvi chamá-lo de Hachid

o meu cão não tem ideologias
rosna, se não gosta
abana o rabo, se quer bem

bem faz o meu cachorro
que não é corintiano nem evangélico
eu, sim
que tenho essas manias
de sonhar com um mundo melhor
e ter impulsos igualitários

sou preocupado com as comodidades
da boa ração

meu cão nem existencialista é

eu que sou idiota
inventando esperanças e revoluções
crio céus e infernos
culpas e outras ignorâncias

se eu fosse mais racional
buscaria a cãononização




Oswhaldo Rosa
Poemas que latem ao coração
Ed. Nova Alexandria, 2009.

Fotoabstração N.59









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Greenlandic Winter



Trata-se do 2019 National Geographic Travel Photo Contest
            Eis a fotografia premiada na categoria Cidades. Pequena vila de pescadores em Greenland.
            Autor: Weimin Chu.




            Experiência emocionante vivida pelo fotógrafo!

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Protesto

Moisés Lobo Furtado

Brasília, 22 de maio de 2018.

Exmo. Sr. Ministro da Educação e Cultura da República Federativa do Brasil,
Vimos, por meio desta, expressar a nossa total indignação contra o contínuo e velado ataque aos cidadãos de bem deste país. Estamos cansados de ser diariamente humilhados em reuniões familiares, igrejas, bares e, mais recentemente, nas redes sociais. Isso precisa acabar.
Sempre apoiamos a intensiva campanha que este governo tem feito nos últimos anos contra o “bullying” nas escolas. Reivindicamos agora um pouco de atenção para a nossa causa. Temos sido surpreendidos e desmoralizados a todo o momento com novas regras e modas nas formas de se conversar e de se escrever.
 Estudos recentes comprovam que a constante e rápida mudança no uso coloquial e ortográfico das palavras tem se tornado a maior causa de ansiedade e depressão em adultos. Pesquisadores chineses afirmam que esse pode ser o principal fator responsável pelo aumento do número de suicídios a partir da quinta década de vida em todo planeta.
Não nos referimos aqui aos inevitáveis dialetos profissionais dos médicos, advogados e mecânicos. Nossa queixa está no cotidiano. Um simples pedido de uma “média” na padaria da esquina se tornou uma atividade embaraçosa. Ninguém nos compreende. É “pão na chapa com pingado”ou nada feito.
Nossos pais, já se queixavam do desaparecimento dos saudosos  ensinos primário, ginasial e científico. Contudo, em muito menos tempo foram extintos os nossos “primeiro, segundo e terceiro graus”. Sem qualquer período de transição, nos impuseram os termos fundamental, médio e superior. Como se comunicar nas reuniões de pais e mestres, quando mal sabemos em que nível de escolaridade estão nossos próprios filhos?
Mesmo no esporte preferido mudaram todas as posições. Entraram volantes, alas e líberos. Graças a Deus ainda não mexeram nos zagueiros, mas como jogar sem pontas? Assistir futebol nos bares tornou-se um constrangimento. Quando gritamos que foi “corner”, somos praticamente fuzilados por olhares de reprovação de todos os jovens presentes.  “Escanteio, tio. Foi escanteio”. Melhor ficar em casa.
No JN, antigo Jornal Nacional, “risco de vida” agora é “risco de morte”, favelas são comunidades carentes, negros são afro-descendentes e a simples palavra homossexual não define mais coisa nenhuma. Nada contra o politicamente correto, porém o exagero é evidente. Esta cada vez mais difícil esconder que nascemos nos anos 1960. 
Isso sem falar nas esquizofrênicas mudanças de ortografia. Temos verdadeiras crises de pânico quando precisamos do hífen. O mandachuvadeve usar guarda-chuva, mas tem que tomar cuidado com o para-choque. Acentuar hiatos tornou-se um risco de vida e morte. A saúvacontinua a mesma, mas quem nasceu em Bocaiuvaestá achando nossa língua uma feiura. Todas as plateiassorriem de nossas ideias
Perdemos completamente o trema e a tranquilidade. Quase todos acentos diferenciais foram abolidos. Isso mesmo: quase todos. Ora, ou se acaba com tudo ou não. O “pára com isso” perdeu o acento e a força. Como pode se escrever “como pôde” e ser compreendido? Vossa excelência precisa pôrordem nisso urgentemente.
Somos estrangeiros em nosso próprio país. Caso nada seja feito, seremos a primeira geração de seres humanos que passará a segunda metade da vida tentando esquecer o que conseguiu aprender na primeira. Morreremos surdos, mudos e analfabetos.
Certos de poder contar com vosso apoio, desde já, agradecemos pela atenção dispensada.
 Atenciosamente,

        Associação dos Portadores de Mais de Cinquenta Anos – APMCA.


Observação: Moisés é médico oftalmologista, estudioso das coisas humanas, aprecia a literatura e gosta de escrever. 
          Tem frequentado oficinas de escrita em Brasília. Este Louco tem a honra de apresentá-lo, na expectativa que esteja sempre presente neste blog. 
          Seja bem-vindo, querido amigo Moisés!

terça-feira, 11 de junho de 2019

novidade




rumor no jardim
passarinhos assustados
a pequena fonte


Bem mais poética é a quadra de meu irmão Paulo Sergio, sobre a mesma fonte:

A fonte, silenciosa,
a umedecer o jardim,
seduz a ave medrosa.
O paraíso é assim...




Foto: AVianna, jun 2019, iPhone 8 plus

Fim de papo


O pai da moça não queria o namoro. A família do moço visitou o homem, para a conciliação. Ele matou o pai, a mãe e o atrevido namorado.

Amizade


Velho, cansado, descrente da vida e dos homens, encontrou um novo amigo. Assustado, renasceu.

Nosso amigo José Renato

Galeria de Família


José Renato Gilli



Tia Juquinha

Talvez minhas filhas e sobrinhas nunca tenham ouvido falar dele. Mas José Renato Gilli foi figura importante em minha infância e na de meu irmão Paulo. Penso que Maria Helena não o conheceu, mas não estou certo disso.
            José Renato morava na pequena Floriano, RJ, onde nasceu nossa mãe, e era filho de Tio Leão e Tia Juquinha, irmã de Ondina. Nosso primo em primeiro grau. 
Sempre que os visitava, os pais exigiam que ele declamasse, em ordem cronológica, os nomes de todos os Presidentes da República, o que ele cumpria com galhardia e algum constrangimento. Por isso era considerado o gênio da família.
            José Renato nos tratava a mim e ao Paulo com especialíssima sincera deferência: nos dava estilingues de presente, com forquilha de goiabeira e borracha de primeira, verdadeiros objetos de arte; certa vez nos presenteou com pequena mesa de sinuca, feita de caixote, revestida de feltro verde, uma lindeza. Aceitávamos tudo, avidamente.
            Adulto, permaneceu residindo em Volta Redonda, funcionário da Companhia Siderúrgica Nacional.
            Lembro-me bem de sua franciscana humildade. Um amigo de verdade, por quem sinto saudade. Por onde andará?

segunda-feira, 10 de junho de 2019

Habilidades



A restrição ao número de horas de trabalho dos residentes significa que eles acumulam menos experiência com operações
Foto: Michael Buholzer/Reuters


A reportagem é de Kate Murphy, para The New York Times (10 jun 2019), e traz o título Brincadeiras infantis podem ajudar na formação de cirurgiõesA despeito de estar aposentado, o assunto me cativou! Explico.
Estudos em faculdades de medicina dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha revelaram queda na destreza manual de estudantes e médicos residentes. “Alguns dizem que o problema é o menor número de cursos práticos e manuais nos ensinos fundamental e médio – artesanato, desenho e música. Outros dizem que a culpa é do tempo excessivo deslizando os dedos sobre telas em vez de desempenhando atividades que ajudem a desenvolver o controle motor fino, como a costura.” 
Robert Spetzler, neurocirurgião, disse ter desenvolvido a destreza ao tocar piano quando criança e ao realizar cirurgias em ratos-do-deserto no ensino médio. "Quanto mais cedo começamos a nos dedicar a tarefas físicas e repetitivas, mais aprofundado e instintivo se torna o desenvolvimento das habilidades motoras", disse ele. 
“Estudos revelam que, quanto maior o número de procedimentos realizados por um cirurgião, maior a probabilidade de sobrevivência de seus pacientes. 
Atenção para esta informação: “A introdução do limite máximo de carga horária de 80 horas semanais para os cursos de medicina dos EUA em 2003 teve como consequência indesejada limitar a disponibilidade dos residentes de cirurgia de participar das operações.” "Quando estava me formando, por bem ou por mal, eu trabalhava cerca de 120 horas por semana", disse Thomas Scalea, cirurgião e professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Maryland, em Baltimore. "Hoje, os estudantes concluem suas residências com cerca de 900 casos operatórios. Eu tinha quase o dobro disso". 
“Maria Siemionow, cirurgiã especializada em transplantes da Faculdade de Medicina da Universidade de Illinois, em Chicago, passava horas, na juventude, recortando fotos de revistas e criando colagens. Além de desenvolverem a destreza, segundo ela, atividades como essa também exigem uma imaginação tridimensional, planejamento, paciência e precisão.”
“Maria acredita que os estudantes podem aprender a ser grandes cirurgiões, mas precisam de algumas habilidades como pré-requisito.” "Analisamos as médias deles e suas notas nas provas, sua produtividade na pesquisa e na autoria de estudos, mas, na realidade, ser um bom cirurgião nada tem a ver com esses pontos", explicou Michael Lawton, sucessor de Spetzler no Instituto Neurológico Barrow. "O mais importante é seu manuseio dos instrumentos e sua maneira de lidar com os tecidos, bem como sua reação e capacidade de adaptação sob estresse". 
            
            Participei durante muitos anos de provas de seleção para médicos residentes de Cirurgia na Universidade de Brasília e não me lembro de ter avaliado as habilidades dos candidatos, o que na prática seria bem difícil. No máximo, olhava para ver se o gajo tinha as duas mãos. (Com o passar do tempo as mulheres se apresentaram como candidatas.) Também por isso a reportagem acima despertou tanto interesse.
            Há um outro motivo, entretanto, mais forte e que me trouxe gratas lembranças. Eu não tinha mais que 7 anos de idade quando minha mãe me pediu para fazer uma limpeza e lubrificar a máquina de costura dela, da famosíssima marca Singer. Na época foi um grande desafio, cumprido com tanta eficiência, que todo ano o expediente se repetia. O menino ouvia os elogios, que não eram poucos, com enorme satisfação (nossos pais jamais foram pródigos em elogios).
            Até que certa feita a mãe vaticinou, Quando crescer você vai ser cirurgião! Ao que respondi, Eu não! Minha negativa não funcionou. As negativas nunca funcionam, apenas reafirmam.





sexta-feira, 7 de junho de 2019

Ilustre visitante



Apresento-lhes o ilustre visitante que apareceu ontem por aqui, macaco prego de cara preta, grande,  pelagem bonita. Passou um bom tempo comendo o galho de uma sapucaia. Quando eu assobiava para ele, ele respondia. Não posso dizer que é da Família, mas será sempre bem-vindo. Da próxima vez ofereço-lhe uma banana.








Fotos: AVianna, jun 2019, jardim.
Nikon D7200, lente AF-S Nikkor 18-300 mm

quarta-feira, 5 de junho de 2019

Eutanásia aos 17 anos




“Adolescente de 17 anos, traumatizada por múltiplos estupros, morre após pedir eutanásia na Holanda.” Esta a manchete publicada hoje por El País, na reportagem de Isabel Ferrer, (Haya, 5 jun 2019).  Ainda não foi confirmado se ela recebeu ajuda médica para pôr fim à vida.
Noa Pothoven, adolescente holandesa de 17 anos vítima de transtorno de estresse pós-traumático, anorexia e depressão, morreu no último domingo em sua casa, em Arnhem, Holanda. 
Informa Ferrer: “A primeira agressão sexual contra Noa ocorreu quando ela tinha 11 anos, em uma festa escolar. Até então, tinha sido uma menina alegre e com boas notas na escola. Um ano depois, voltou a acontecer, desta vez em uma festa de adolescentes. Quando completou 14, foi estuprada por dois homens em um beco da sua cidade. Na época não contou a ninguém. Só depois denunciou, e sua mãe, Lisette, explicou que reviver o ataque foi demais para sua filha. Desde então, ela sofria de anorexia, e sua vida virou um entra-e-sai de hospitais e centros especializados. Ao comprovar seu estado emocional, os juízes a internaram à força em uma instituição durante seis meses: lá foi imobilizada e isolada para que não se lesionasse. “Nunca, nunca mais voltarei para um lugar assim. É desumano”, disse Noa, tempos depois.”
Ao sair dessa clínica, a anorexia piorou. Sua família denunciou a falta de lugares apropriados na Holanda para casos como o de sua filha, que acabou hospitalizada e com uma sonda nasogástrica.” 
Em 2018 ela publicou um livro, intitulado Ganhar ou Aprender, em que contava sua história. O livro ganhou um prêmio em março passado, e Noa, na época, comentou: “Não sei se continuarei escrevendo”.


 
Capa do livro de Noa Pothoven

“Noa solicitou a eutanásia porque não aguentava mais seu sofrimento. “Serei direta: dentro de dez dias terei morrido. Estou exausta após anos de luta, e parei de comer e beber. Depois de muitas conversas e de uma análise da minha situação, decidiram me deixar ir embora, porque minha dor é insuportável”. "Não vivo há muito tempo, sobrevivo, e nem isso", contou na sua mensagem final. “O amor é deixar ir embora. Neste caso é assim”, acrescentou, aproveitando seus últimos dias para se despedir da família e amigos.”

A eutanásia é legal na Holanda desde 2002, e maiores de 12 anos podem solicitá-la se sofrerem de enfermidades sem cura e padecimentos insuportáveis. Até os 16 anos, é necessária a autorização dos pais. Na Holanda a eutanásia não costuma ser solicitada por adolescentes ou jovens com dores psíquicas, como é o caso aqui relatado. 



terça-feira, 4 de junho de 2019

Ebola na República Democrática do Congo



Ebola: 1.346 mortes em dez meses de epidemia
(Baz Ratner/Reuters)


AFP informa (4 jun 2019) que mais de 2.000 pessoas contraíram o vírus do ebola no leste da República Democrática do Congo.
1.346 delas faleceram desde o início da epidemia há 190 meses.
539 pessoas foram curadas.

       E o mundo mais adiantado economicamente, mais rico portanto, presta pouca ou nenhuma atenção a esta tragédia. Não é difícil imaginar o escândalo, com enorme repercussão na mídia internacional, se apenas uma pessoa morresse de ebola em Nova Iorque ou Paris.



Um olhar

Galeria de Família





A escola – o famoso Instituto de Educação “Conselheiro Rodrigues Alves” – tirou uma manhã para fotografar os alunos. Deve ter contratado um fotógrafo profissional.
            Os alunos sentavam em frente a uma pequena mesa, pegavam da caneta, fingiam escrever alguma coisa num caderno aberto sobre a mesa, os olhos pregados na câmera, e ao fundo a Bandeira Nacional, salve salve o pendão da esperança!
            Paulo Sergio foi assim fotografado ainda no curso primário, penso eu, usando suspensórios, o cabelo bem cortado, a mão esquerda fechada a sugerir alguma tensão, e o olhar mais doce do mundo!